Em Memória do Meu Pai (21/06/1944 - 17/02/2008)

segunda-feira, fevereiro 18

Tu eras o meu Big e eu a tua Baby.

Às vezes eras maior que a vida, um lutador por excelência e o maior apologista de mim que alguma vez cruzará a minha vida. Não te interessava o que eu quisesse fazer, só querias que eu o fizesse bem, sem medo e com tudo o que eu podia dar. Tão depressa me davas uma palmada nas costas por eu querer ir para a catequese, como o fizeste por eu querer ir para o karaté.

As poucas regras que me impunhas eram exactamente as mesmas com que conduzias a tua vida “Máxima liberdade, máxima responsabilidade”, “Sê tudo o que quiseres, mas sê…” E tu eras!

Lembro-me de agarrar o teu dedo mindinho quando andávamos de mãos dadas, fui crescendo e passamos para o indicador, depois para a mão toda. Lembro-me de me dizeres vezes sem conta que monstros e fantasmas não existiam, e quando comecei a ter terrores nocturnos ensinaste-me a trazer para os meus sonhos o super-homem para dar cabo dos maus.

Ensinaste-me a cozinhar (não cheguei a apreender a fazer o arroz de lingueirão, íamos tratar disso este verão) e a conduzir. Ensinaste-me a falar e a escrever português (mesmo que às vezes eu insista no pretoguês). Ensinaste-me a história de Portugal (mesmo quando eu insistia que compreender o passado em nada ajudava a viver o presente, compreendi depois que querias que eu sentisse uma pátria, porque conhecias o peso de não pertencer a lado nenhum, o peso de ser pária, ou cidadão do mundo como dizias a rir). Ensinaste-me a jogar na bolsa e no casino. Ensinaste-me que só se podia ser racista se existisse falta de uma cor, o cinzento da massa encefálica.

Por três vezes desiludi-te, vi-o no teu olhar, ouvi-o nas tuas palavras e senti-o como uma perda (eu nunca queria desiludir-te, mas sabia que era inevitável para seguir o meu caminho – também isto era crescer), no máximo um dia depois, sentavas-me à mesa, olhavas-me de frente e dizias que a escolha era minha, que não achavas piada, mas que a escolha era minha, pelo que estarias ao meu lado e logo ali começávamos a traçar o plano para concretizar a minha escolha. Depois eram as nossas horas perdidas a discutir economia, geopolítica, política, culturas, literatura (como adoravas Camões e Pessoa) e a vida.

O que tu gostavas de rir, o teu passatempo favorito era contar anedotas e histórias de vida, de vidas, que acabavam invariavelmente numa gargalhada. Lembro-me de chegares a um bar ou restaurante e se as pessoas te parecessem tristes ou sérias, começavas a rir, a rir, e ias contagiando a tua mesa, a mesa do lado, outra em frente e por fim, o resto da sala (eu ficava tão envergonhada, e tu a rir dizias que era o eles estavam a precisar).

Hoje despeço-me de ti e sinto o que me ensinaste, que embora estejas ausente, tu vives em mim. Nos últimos 10 anos víamo-nos um mês por ano, e na tua ausência tu vivias em mim, agora ver-te-ei quando morrer e até lá viverás em mim.

Não te preocupes comigo eu fico bem, eu sou da tua cepa ensinaste-me bem, a vida não me mete medo (eu sei que às vezes dói, como agora, mas como me dizias “é só dor não te assustes”).
Vou caminhar mais sozinha, mas vou caminhar como me ensinaste. Vais fazer-me falta…
Good bye Big, I Love You!

57 comentários:

MC disse...

I'm so sorry, AR...
Muita força e beijinhos.

Duca disse...

Nestas ocasiões nunca sei o que dizer, apenas que estou e estarei se precisares.

Beijo

Anónimo disse...

Lamento imenso. Muitos beijinhos para ti e não apagues a luz que há em ti, uma luz apagou-se mas a tua deve continuar acesa.

Anónimo disse...

Bem,primeiro que tudo tenho que salientar a excelência do que por aqui se escreve.. Em segundo lugar, dizer que a minha orientação é heterossexual,mas que aprecio a liberdade de toda a gente,da mesma forma que aprecio a minha. Agora o que me fez escrever foi a vontade de dizer que ler este pequeno testemunho, fez-me lembrar o quão bom foi ter um pai e o quão bom é,apesar de já o ter perdido,ter tantas coisas boas para lembrar...Obrigada por me ter feito lembrar de tudo isso;)*

Anónimo disse...

Lamento muito a tua perda, AR.
Um abraço sentido e estamos aqui para o que for preciso.

Cosmopolita disse...

Minha querida, querida amiga, fiquei tristíssima com esta tua perda!

"Nada apaga a luz que vive, no amor do pensamento, não há morte para o vento, não há morte"! Tal como dizes, ele há-de sempre viver em ti. Faz de conta que ele está noutra dimensão ou num país em que não há telefones, mails, etc, recorda-o sempre assim, vivo e cheio de alegria a caminhar ao teu lado a proteger-te com todos os ensinamentos que te transmitiu.

Um grande, grande abraço!

Siona disse...

[Hug]
(Este é um dos meus blogs favoritos, e são os teus posts os de que gosto mais. Tenho pena de só poder oferecer um abraço virtual a quem me tem proporcionado muitos momentos de leitura agradáveis e divertidos. Um abraço muito grande para ti, daqueles que sobrecarregam os anexos do Gmail, ok?)

Anónimo disse...

Olhar em frente e força para superar todos os momentos da perda.


ES

Anónimo disse...

Visitando pela primeira vez...
Tb sou entendida, sei como é complicado essas coisas, força pra ti
bju

Anónimo disse...

Nestes momentos deixam-se votos de pesar,o que também aqui deixo. Mas o meu objectivo é felicitar-te por teres um pai tão especial e maravilhoso! É essa memória que deves guardar para sempre no teu coração.
Um beijo de força meu e da minha namorada.

Marlene disse...

O que dizer? Nada mais do que já disseste...sabes bem a que memórias te abraçar...

Um sorriso calmo e um abraço para ti.

Ji disse...

Um beijo em cada bochecha!

Muah!

rv disse...

sinto muito a perda apesar de ter percebido que a presença do teu pai foi a que se espera de qualquer um,apesar de não ter confiança para tal envio um abraço como um reforço da coragem que a vida exige...

pegueitrinquei disse...

a minha mãe também foi há um ano. E só tinha 42 anos. Foi o Santa Maria que ma roubou.

Força. Custa, eu sei*

;(

M de M disse...

Admiro a tua coragem por lhe prestares tão a quente...Como dói a perca do sangue do nosso sangue.

Um grande beijo cheio de vida, para ti!

indigo des urtigues disse...

Um abraço forte!

Anónimo disse...

O teu texo ao teu pai é linfo. Fiquei de lágrimas nos olhos ao ler. Força e como tu dizes ele vive em ti :)

Morgana disse...

*kiss*

sunrise in aries disse...

Parece-me um grande senhor. E também que tiveste muita sorte em ter uma pessoa assim desde o início da tua vida até agora, que te deixou tantas coisas e tão boas. Deixa-me contente que saibas que vai continuar sempre, sempre contigo. (porque já passei por algo semelhante com um amigo que não conseguiu, de inicio, perceber isso. e é angustiante)
não me prolongando mais, beijinho e força *

Anónimo disse...

'Canto, mas o meu canto é triste
Não sou capaz de nenhum outro agora
..........
Felizmente sei cantar sem pressas
Sei recomeçar,
Sei que há uma promessa
No acto de cantar'.
Miguel Torga

Sei o que estás a passar. A partir de ontem brilhou mais uma estrela no céu. Eu vi!

Abraço de solidariedade.

M de M disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
indigente andrajoso disse...

“é só dor não te assustes”

abraço

Helena disse...

Nesta altura ... apenas um grande abranço e votos de coragem.

Estrelaminha disse...

Pelo que escreves-te não ficaram dúvidas que vais saber caminhar com tudo o que te foi possível absorver e que te foi transmitido.
Lamento.

Anónimo disse...

Porque a vida nos tira sempre aqueles que mais falta nos fazem, que melhor nos compreendem..os nossos apoios, os nossos pilares..fica aqui um abraço de quem encontrou este blog e o leu do principio ao fim e o acompanha diariamente ainda que em silêncio..
Força aí!

Sh.

Anónimo disse...

um abraço.

Narizinha disse...

Beijo grande.
Como vês a blogosfera está contigo.
U hold on...

Joana disse...

Já visito este blog á mais de um ano mas é a primeira vez que comento. Adoro os vossos (em especial os teus) textos, mas este está fantástico embora por um mau motivo. Parabéns pelo pai e pela força que tens! *

Anónimo disse...

o teu texto tocou-me bastante....

underadio disse...

Glup (embargado).
Abraço-te.

Anónimo disse...

Muuuuuuitos abracinhos e muuuuuitas festinhas na barriguinha.

Nós

PS1 Também muuuuuitos beijinhos na boxecha gaija boa
PS2 O PS1 é da parte das bichas

sagitus disse...

não há palavras para estes momentos...
Um abraço bem forte.
*

Anónimo disse...

Lindo o texto, lindo o sentimento !

Força!

Beijo grande.

Anónimo disse...

Embora a tua escrita no blog seja habitualmente leve e cómica e não faças disto um diário, é inevitável que quem te lê sinta que te conhece. E por isso, apesar de amiga "desconhecida" sinto a tua perda e quero deixar-te um beijinho.

Anónimo disse...

um beijo, sim.

Always disse...

Deixo-te um abraço. As pessoas só desaparecem de facto quando nos esquecermos delas. O SEMPRE depende de saber recordar.

Abraço

cris disse...

Ola,
julgo q nao nos conhecemos, mas este teu post comoveu-me muitissimo. Nao me esquecerei tao cedo destas historias do teu admiravel pai.
Memorias - como estas q tiveste a generosidade de partilhar aqui e outras q guardas so contigo - nao se apagam jamais. E' por isso q as pessoas q amamos vivem mto para la' da sua presenca fisica. Vivem em nos, pq tivemos o privilegio de um dia as ter conhecido e amado.
Aguenta firme.

Anónimo disse...

Muito obrigada a tod@s... Apesar de não vos parecer, as vossas palavras são reconfortantes... Muito Obrigada...

Até breve!

Anónimo disse...

Numa perda destas não existem palavras de conforto. Deixo-te um abraço e um beijinho e toda a força que eles puderem comportar.

Anónimo disse...

... nem sei como começar.
Bem, eu vinha aqui só para javardar, admito que tenho algum perconceito.
Mas chego aqui e dou de caras com este texto tremendo e faltou-me a força. Como eu te compreendo...
As minhas desculpas pelas minhas más intenções quando aqui entrei.
Os meus respeitos.

Chocolover disse...

Um beijinho e um abraço!

Angelo disse...

Nao nos conhecemos, e isso nao importa. Com estas palavras so espero que sigas em frente sempre com a imagem excelente que tao bem descreveste!

desabafos disse...

Já tudo foi dito, e por muitas palavras que se digam, nada mudará o facto de já não teres o teu pai junto de ti fisicamente. No entanto, deixo-te um abraço forte. Continua a caminhar como o teu pai te ensinou, é a maior homenagem que lhe podes prestar.

Anónimo disse...

Também n' O Nascer do Sol (http://onascerdosol.blogspot.com/) a mesma desgraça.
É sabido que com as desgraças dos outros podemos nós bem, mas... a net é isto: ligar. Como o Lourenço Bray lá diz, perceber "que não estamos sozinhos".

Anónimo disse...

"Bem-aventurad@s os que crêem no
Amor de Deus por seus filhos,
esses nunca se sentirão abandonados,tudo podem e tudo superam."

Lamento muito, tão grande perda.

Um ABRAÇO de LUZ

Luís disse...

O tempo ajuda a ultrapassar as ausências, mas nunca a esquecer. Parabéns pelo pai que teve!

nada desta vida disse...

vim cá parar e dei de caras com este texto poderoso. conseguiste comover me. tens muita sorte por ter um pai assim companheiro e utilizo este tempo verbal porque acredito que o teu pai vai sempre viver dentro de ti, naquilo que te passou. deixaste me assim uma pontinha de inveja. gostava tanto de poder falar com esse sentimento do meu. mas não posso. um beijo mesmo assim para o grande* obrigada pela partilha*
inês subtil

Anónimo disse...

Nada que dissermos vai fazer c/que o peso seja menor.. Ao ler teu post tive a impressão que teu pai foi uma estrela cadente que fez o caminho inverso. Ele estará contigo, assim como vc estará c/ele "sempre".

Anónimo disse...

Um beijo amiga...simplesmente UM BEIJO!

Lápis-lazúli disse...

Acredito que ele foi um grande homem porque sei que tu és uma grande mulher, e tendo ele sido um dos grandes responsáveis pela pessoa que és hoje, sinto por ti a sua partida. Um abraço com amizade...

Anónimo disse...

Sinto-me previlegiada por ter conhecido o teu pai.
Era sem dúvida uma pessoa extraóridinária, tal como tu.
És uma amiga linda, adoro-te!
Bjs
Mi

Memory disse...

Deixo aqui um abraço forte e desejos de muita força...

Um abraço

Teresa disse...

Já aqui vim várias vezes, sempre sem coragem para comentar. Qualquer coisa que se diga é sempre pobre perante uma perda tão irreparável. Ceixo apenas um grande beijo de alguém que sabe o que isso é.

Anónimo disse...

e voltemos ao post anterior...caí aqui por um acaso ou não! porque afinal não estamos sós e quem connosco se cruza nesta vida (e quem sabe noutras), é para deixar/levar alguma coisa...como alguém atrás disse, já quase tudo foi dito...deste blog ainda só li dois posts, não faço a menor ideia de quem aqui nem sobre o que se escreve, mas fui tocada por dentro, por partilha de pensamentos e vivências similares...
canta o L. Represas "só Deus tem os que mais ama..."seja, mas os que amamos por mais que estejam "enterrados", nunca o estarão dentro de nós, em nós estarão sempre entranhados...senti, talvez por herança desse Sr. (teu Pai), que és uma pessoa cheia de força...o meu mundo caiu com a viagem mais longa da minha Mãe, e só por continuar a senti-la tão viva em mim tenho tido a coragem de me levantar todos os dias...não há mais a dizer...a não ser que prefiro o que o P. Abrunhosa canta "não há saudade sem regresso..."
Beijinho de alguém que caiu aqui meio de para-quedas e não se conteve. (desculpa se fui inconveniente, mas tocaste-me)

d. disse...

... Força aí! Beijo enorme!

Anónimo disse...

AR, quando perdemos um ente querido é certo que sofremos muito. Isso é natural.
Mas há o sobrenatural, isto é, a vida eterna, pois, nos planos da perfeição espiritual, os filhos tornarão a ver os pais, os irmãos reencontrar-se-ão, os amigos abraçar-se-ão de novo.


Saudações Fraternas

Amélia Grimaldi disse...

AR: sabes bem qual o meu registo habitual. É parecido com o teu.
E nesta altura dura (perca e saudade) para ti, só te posso dizer que chorei com o teu texto. Sente-se a dor, o amor, o orgulho, a cumplicidade. E também porque estou a passar por um momento doloroso, um pouco no mesmo sentido que o teu.

Por isso mesmo, recebe este abraço e um beijinho na testa, seguido de uma festa cúmplice no teu rosto, para te dar uma ajuda para poderes ultrapassar esse nó na garganta, essa vontade de gritar, a necessidade de te aninhar e esconder do mundo.

Para já resta saberes que ele (aliás..., Ele!) continuará a olhar por ti e para ti. Com orgulho, como sempre. E com o mesmo amor infinito.
É só um mero até já...

Amélia