As Doze Badaladas

quarta-feira, dezembro 31


1. Que o próximo ano me corra tão bem como este.
2. Que a crise acabe, que já não posso ouvir falar dela.
3. Que o Sócrates termine o curso e que vá trabalhar para outro lado qualquer.
4. Ganhar o euromilhões. (Esta tinha que ser.)
5. Quero um bar lésbico/gay em cada bairro de Lisboa e, já que é para pensar em grande, em todas as cidades do país.
6. Que o trânsito no natal que vem diminua. E no resto do ano também.
7. Uma casa toda em vidro no meio de uma praia paradisíaca, como prenda de anos.
8. Quero uma presidente da câmara gira, lésbica e com casamento planeado para este ano ainda.
9. Quero um primeiro ministro gay... assumido!
10. Quero que a igreja acorde para a vida e que o papa entre na marcha gay .
11. Que o gay pride este ano seja em cima da ponte 25 de Abril. (Talvez não seja boa ideia...)
12. Que não sejam precisas passas para o ano. (Eu não comi as minhas o ano passado.)

Bom 2009!

Conto de Natal lésbico – versão angélica

quarta-feira, dezembro 24



Nestes dias frios sabe bem voltarmo-nos para dentro e recordarmos memórias quentes e doces de outros tempos. Apesar de ser verdade que não há nada como viver o momento presente, por vezes são também essas memórias que nos ajudam a apreciar ainda melhor aquilo que temos. Posto isto e desejando a tod@s um excelente Natal, aqui vai mais uma memória desenterrada do meu baú para vossa apreciação.

Terão passado mais de trinta anos sobre aquilo que agora conto, talvez a história não tivesse sido assim, mas quando a embrulhei quis preservá-la com toda a inocência dos meus verdes anos. Não foi a minha primeira experiência sexual com uma mulher, mas terá sido das primeiras, naquelas alturas em que tudo era ainda praticamente desconhecido, e fascinante também pelo muito que se imaginava e adivinhava por trás de meninas de caras de anjo com cheiro a terra molhada e a pinheiros bravos. Seríamos todas um pouco selvagens, naquele tempo não havia quem nos controlasse como hoje. Ninguém nos perguntava o que fazíamos nem com quem, desde que as tarefas diárias aparecessem cumpridas.

Com dezasseis anos eu era já uma mulher feita, carregando o fardo mensal que me tornava fértil, apesar de me sentir dona dum útero morto à partida, mero ponto de passagem dos meus óvulos virgens de semente de homem que eu não queria nem desejava em mim. O prazer sexual já o tinha descoberto, e os meus sonhos e fantasias encontravam-se povoados de belas ninfas louras, angélicas e sensuais que me cobriam de carícias e beijos e me faziam acordar num estado pré-orgásmico difícil de justificar.

A aldeia vivia no frenesim habitual da época festiva. Todas as famílias se preparavam para a festa familiar que se avizinhava e a minha não era excepção. O meu pai andava fora, em busca de trabalhos sazonais, e as minhas avós afadigavam-se na preparação dos animais para a matança e posterior comezaina. Alheia ao que se passava à minha volta eu e Joana preparávamos a nossa fuga de casa. Joana era a minha paixão no momento, aquela que eu mais amava desde sempre. Era mais velha do que eu mas era eu que liderava os nossos jogos passionais. Ainda hoje penso como é possível uma menina, quase ainda criança, saber tanto como eu já sabia sobre a anatomia feminina e sobre as melhores maneiras de proporcionar e obter prazer duma mulher. Talvez eu tivesse mesmo nascido com o diabo no corpo, muito curiosa sem dúvida, e diferente, bastante diferente de tudo o que eu conhecia naquela aldeia perdida nos confins do mundo civilizado.

Se é verdade que algumas de nós se reconhecem pelo mero olhar, eu possuo essa característica e assim que vi Joana soube que ela era como eu. Talvez seja pela profundidade, pelos segundos extra que deixamos que os nossos olhares se passeiem pelo corpo que se nos oferece com plena aprovação e consentimento da dona duma pele tão apetitosa que nos dá vontade de tocar e acariciar. Assim Joana olhou para mim e eu para ela e desde esse dia decidimos que o presente de Natal uma da outra seria um orgasmo a dobrar. Serão coisas de juventude inconsciente mas nessa altura uma noite com Joana era o melhor presente que me poderiam dar.

Hoje não me recordo se Joana era loura ou morena, mas sei que tinha uns olhos de um azul escuro, quase violeta. Gosto de imaginá-la loura, usando uma paleta de cores muito minha, pinto-lhe umas bochechas de tons rosados, desenho-lhe um nariz pequeno e empinado e uma boca não demasiado grande com uns lábios carnudos e muito sensuais, seguindo-se-lhe um corpo perfeito de ninfeta com pequenos seios redondos e macios como duas meias maçãs, como se tivesse saído dum qualquer conto de fadas pronta para ser apreciada por quem a esperava com uma gula desmesurada própria da idade da eclosão dos sentidos. O que eu suei por ela, de cada vez que a sentia perto de mim, a olhar para mim, querendo-me como eu a ela, da mesma forma, escorregando as duas para sonhos carregados de erotismo e prazer numa idade em que quase nos masturbávamos com o olhar.

Foi ela que quis esperar pela noite de Natal, dizia que nessa noite ninguém nos viria procurar, ninguém se daria a esse trabalho sabendo que não vale a pena procurar quem não deseja ser encontrado. A noite de festa faz-se de quem quer ali estar e não dos que fogem procurando algo que ninguém ali lhes pode dar. E o que eu queria só estava ao alcance de Joana, da minha ninfeta de olhos violeta e pele clara e macia.

Aproveitamos a saída dos adultos para a missa e fugimos para o esconderijo que tínhamos previamente preparado. Eu tinha encontrado uma braseira no sotão de casa de uma das minhas avós e Joana tinha levado cobertores que espalhamos no chão do quarto dos seus irmãos mais velhos que já não moravam ali. A cama era velha mas o colchão sempre providenciava mais conforto do que o chão de madeira velha pelo que arrastámos o colchão até perto da braseira para nos mantermos quentes enquanto durasse a nossa entrega mútua de presentes. Joana tinha conseguido roubar uma garrafa de cidra a um dos seus tios e começamos por brindar a nós, ao nosso primeiro Natal juntas, e àquilo que seria a nossa primeira noite de amor. Eu já tinha alguma experiência, a Joana não, por isso fui eu que lhe tirei o copo da mão e suavemente a empurrei de encontro ao colchão onde nos tínhamos sentado. Sentindo os seus olhos sorridentes em mim aproximei-me e comecei a desapertar-lhe os botões da camisa, inebriando-me com o seu cheiro quente e doce à medida que aproximava a minha cara dos seus pequenos seios redondos e perfeitos.

Há momentos que queremos preservar igual, parar o tempo, sentir o mesmo durante muito mais do que aqueles breves segundos em que a minha boca tocou na pele macia dos seios de Joana e alguma coisa se iluminou dentro de mim. Senti o calor a espalhar-se da minha língua para a minha boca, descendo pelos meus seios até atingir em pleno o meu sexo quente e molhado. Despi Joana por completo para finalmente conseguir contemplar o seu corpo ali deitado em oferta merecida e conquistada por mim.

É sempre difícil para quem ama o belo expressar por palavras aquilo que é amar uma mulher, como descrever o seu cheiro, a suavidade da sua pele, a doçura do seu sabor, a cor maravilhosa das auréolas dos seus seios, daquilo que se esconde para lá da penugem do seu sexo... deveria pintá-la em vez de escrevê-la, e mesmo assim nunca lhe faria justiça!

Não queria atemorizá-la, sabia que ela nunca tinha sido tocada, prossegui da forma mais gentil que consegui, acariciando-a e beijando-a à medida que a minha boca descia pela pele macia da sua barriga. Aqueles eram os primeiros caminhos do prazer no corpo de Joana, traçados por mim que a amava mais do que a própria vida! Tinha que ser tudo memorável, uma experiência única que jamais seria esquecida por ambas!

Joana não teve medo e entregou-se totalmente a mim, abrindo as pernas e deixando-me escorregar até chegar bem perto do seu sexo. Olhei-a e vi o assentimento pleno que me convidava a avançar por isso o fiz, milimetricamente, célula a célula, até passar a barreira da penugem, atravessando-a primeiro com os dedos e depois com a língua. Fechei os olhos para sentir e saborear mais intensamente aquele momento tão bom. Joana sabia a... uma mistura de... maçãs com compota de framboesas... mas com um cheiro intenso a flores... jasmins... orquídeas... algo de indescritivelmente bom! Eu sentia que ela estava a gostar do prazer assim proporcionado, pela forma como o seu corpo se mexia e o seu sexo se levantava de encontro à minha boca expectante e desejosa de saborear mais ainda. E eu era a primeira a provar o sabor de Joana e saber que nunca ninguém tinha chegado ali servia como combustível para a minha já de si intensa excitação!

A minha língua continuava a dançar à volta do interior do sexo de Joana, passeando-se pelas bordas, sorvendo aquele sabor intenso e perfumado, tão doce... até que ouvi Joana a gemer, senti o seu corpo tremer e de repente a minha recompensa chegou na forma de um líquido espesso e abundante, transparente e tão doce como o mel. Inundou-me a boca, o queixo, o pescoço, transbordou-me até aos seios, fiquei coberta do néctar puro e doce da virgem que se tinha deixado possuir e deixei que os meus poros absorvessem a santidade dele e do momento! Inebriada que me encontrava pelo cheiro do sexo de Joana nem me apercebi que ela já se tinha apoderado do meu e vigorosamente me arrancava das entranhas um inesperado orgasmo poderoso e profundo! Assim as duas baptizadas uma pela seiva da outra nos enrolamos nos cobertores a beber cidra e a rirmos daquilo que tínhamos feito e que nos tínhamos dado nessa noite de Natal.

E é isso que vos quero desejar a tod@s, que passem uma noite de Natal bem quente e sensual ao lado de quem mais amam, com muito carinho, amor e paixão!

E o Beijo, hum?!

segunda-feira, dezembro 22

Nos preparativos para a grande passagem de um ano para o outro surgiu uma pequena dúvida:
Como se passa um ano sem o selo do costume, o beijo? É que um casal amigo não assumido perante as crianças colocou uma cláusula obrigatória, a de não haver beijos na boca e coisas do género. Cláusula aprovada, festa organizada e várias hipóteses em vista:
1. Fechar as crianças, acidentalmente, na casa de banho por volta das 23:5o.
2. Fecharmo-nos a nós, acidentalmente, na casa de banho por volta das 23:5o.
3. Embriagar as crianças a ponto de elas não saberem o que estão a ver.
4. Dizer que é um jogo que fazemos e que este ano calharam aqueles pares.
5. Dizer que gostavamos de experimentar a sensação de ser a Diana Chaves por um momento.
6. Dizer que comemos uma passa da outra pessoa e que isso não dá sorte.
7. Embriagarmo-nos a nós próprias a ponto de não sabermos o que estamos a fazer...
Sem beijo é que não!

Um utópico 2009!


Estamos inevitavelmente em tempo de balanço e pensamentos profundos. Ninguém escapa. Quem não gosta do Natal tem sempre, na semana a seguir, o final de ano. E qual não é a alma que não pára, nem que seja um minutinho, a pensar no que já passou e no que há-de vir?

Pois a minha reflexão este ano, aqui no blog, vai para a discriminação. Grandes progressos dirão uns, grandes paragens dirão outros, e até há espaço para os desiludidos que já contavam com algumas medidas como certas. Não há publicação que não tenha abordado o tema nem programa de televisão ou rádio que não falasse na dita. Há dois dias, mais do mesmo. Pronto, também vou dizer qualquer coisa...

Surgiu-me a reflexão do ano: pertencemos tod@s a alguma minoria e simultâneamente a alguma maioria. Ou porque é a cor da pele ou a orientação sexual, uma deficiência qualquer, um problema de saúde, ausência de pai ou mãe, desemprego, ou por outro lado, grande vantagem financeira, familia hiper-numerosa, ou são muito altos ou muito baixos, muit@s namorad@s ou nenhuns, inteligência que ninguém aguenta... Já estou a ouvir alguém dizer que "pois, há coisas e coisas!".

Pois há! Há as nossas e a dos outros. Ser diferente e ter consciêcia dessa diferença é ter a oportunidade de poder aprender alguma coisa. Está tudo nas nossas mãos. Tenham uma vida diferente e indiferente. Bom ano! ... Não custa um bocadinho de utopia...

Sugestão de Leitura

quarta-feira, dezembro 10



Ouvi a Senhora falar na televisão e gostei. À falta de referências bibliográficas à altura para a apoiar na descoberta da sua orientação sexual e no seu eventual coming out, Laura Levin resolveu escrever um livro que ajudasse outras mulheres que procurassem o mesmo. Chama-se o dito, "Same sex in the city".

Gostei porque aprecio pessoas que tomam nas suas mãos coisas que acham que deviam ser feitas. À opção do queixume e da inércia preferem entrar em acção e melhorar o que acham que tem que ser melhorado.

Gostei porque apesar de não ter nada contra chamar as coisas pelo nome e de isso ainda ser necessário para torná-las visíveis e "normais", concordo com a opinião da autora de que os rótulos são para a roupa.

Gostei porque apesar de não saber a idade da rapariga, pareceu-me bastante jovem ou seja, na minha opinião, não perdeu tempo até ser crescidinha para fazer as coisas pelo seguro, que é como dizer quando for mais fácil para ela. Assumiu essa parte de que nem tudo são rosas quando se trata da nossa vida pessoal. Há que lutar contra as adversidades, às vezes...

E já agora, para terminar, faço minhas as suas palavras e uso um rótulo que poderia ajudar na aceitação das diferenças: sejam "bi happy".

Podia Acabar o Mundo!

sexta-feira, dezembro 5

Até podia acabar o mundo antes de eu pensar que a ficção portuguesa ia passar a exibir em horário nobre uma telenovela com um casal de lésbicas ao beijos na boca!

Epa, que isto está melhor que no Brasil. Fiquei surpreendida, sim senhora. Parece que não é só o beijinho da praxe e que o casal vai ser encarado pela produção como mais uma qualquer parelha a fazer parte da história.

Fica o registo e o "viva a indiferença!". Resta-me esperar algum efeito em algumas cabeças no sentido de desfazer preconceitos, e talvez lá mais para 2050 um L Word português... e já agora, se não for pedir muito, umas leis mais igualitárias.

Salomé - a encantadora de serpentes - parte II

sexta-feira, novembro 21

Claro que eu quis saber quem ela era e o que fazia às mulheres para as deixar assim! Numa escala infinitamente mais pequena também eu procurava algo em todas as mulheres que seduzia. Houve tempos em que também eu todas as noites me abandonava na doçura de corpos quentes e sempre diferentes. Salomé intrigava-me e fascinava-me. E quanto mais ouvia falar da sua mestria como amante de mulheres, mais curiosidade tinha em ir procurá-la talvez numa vã tentativa de a decifrar.

No dia em que finalmente nos encontrámos, no dia em que eu larguei tudo para ir ao seu encontro, eu soube porque Salomé fascinava todos aqueles que com ela se cruzavam. Salomé lia-nos a alma, trespassava-nos com o seu olhar directo e penetrante. Era impossível mentir-lhe, era desconcertante sentir que as palavras das nossas histórias se desmoronavam como castelos de cartas, cartas essas que ela depois escolhia a dedo, seleccionando as que eram verídicas das que não passavam de floreados cuidadosamente escolhidos para impressionar os outros. Foi a primeira, e única, mulher, a quem consegui ver a aura. Talvez eu não seja um ser demasiado espiritual, Salomé dizia-me que a minha aura variava entre o vermelho e o laranja, que supostamente são auras muito físicas. A dela variava de cor. Havia dias em que se passeava por todas as cores do arco-íris, e era impressionante vê-la no centro de tanta cor e luz. Dizia-me que comandava a sua aura, que a usava da maneira que melhor entendia, que se camuflava por trás de certas cores quando queria passar invisível e que usava outras para se valorizar quando queria que todos parassem para a olhar.

Comigo é quase certo que se valorizava, eu via-lhe, sentia-lhe o gozo nascente com que de repente aparecia a brilhar à minha frente. Eu ficava de boca aberta e queixo caído e ela ria-se do meu espanto pueril. Depois pegava-me nas mãos e lia-me o destino, dizia-me que eu seria fisicamente estéril mas que da minha mente brotariam muitas e muitas histórias, tantas que uma só vida não chegaria para as contar todas. Havia dias sombrios, dias em que Salomé se fechava para o mundo, envolvendo-se de negro e escondendo-se no mais profundo do seu ser. Depois desabrochava, vinha ter comigo e acariciava-me, pedia-me para lhe contar uma das minhas histórias inconsequentes e eu fazia-lhe a vontade. Tenho saudades das suas carícias experientes, as suas mãos de fada envolviam-me de tal forma como se estivessem a criar um casulo tão meu, tão primário, tão seguro que era como se de repente estivéssemos dentro do útero materno.

E fomos amantes sim, Salomé percebeu logo que eu era amante de mulheres, tal como ela. Também por isso, talvez por isso, ela me acolheu junto de si como se fosse alguém de família. Para além de ser amante de mulheres, nunca nenhum homem tinha tocado em mim, nunca nenhum tinha penetrado a minha intimidade que só algumas mulheres tinham conseguido apenas beliscar. Agradava-lhe o meu feminismo primário baseado na minha arrogante indiferença em relação ao sexo masculino. Não seria uma fêmea poderosa como ela, mas tinha as minhas aspirações e ambições. Era, talvez ainda seja, uma mulher muito criativa e isso no momento servia-me para seduzir mulheres belas que comigo se cruzavam.

Uma noite, antes de nos tornarmos amantes, foi-me dada a ver uma visão que nunca mais esqueci. Foi nessa noite que percebi que Salomé tinha poderes muito para além de qualquer outro ser humano. Estávamos numa lua nova de verão, e o tempo esfriou abaixo do que era costume para a altura do ano. As pessoas assustaram-se, pediam a Salomé que lhes visse a sua sina, que lhes garantisse que não vinha lá o fim do mundo. A mim incomodava-me a facilidade com que as gentes da aldeia se assustavam com meras mudanças do tempo. Não teriam mais em que pensar, coitados. Mas Salomé não lhes ficou indiferente e nessa noite isolou-se para tentar obter uma resposta.

Contrariamente ao habitual, eu segui-a através das matas e das florestas, até chegarmos a um grande lago, muito escuro e negro, tão diferente dos cursos de água transparentes e cristalinos onde estava habituada a banhar-me. A noite estava tão espessa que só conseguia ver Salomé, irradiando uma luz dourada, como se fosse uma pequena candeia avançando tranquila e segura pelo breu adentro. Ajoelhou-se à borda do lago e sussurrou algo num linguajar sibilante ao qual responderam umas dezenas de serpentes que surgiram por debaixo daquele tapete lago espesso e escuro. Salomé falava com as serpentes! E logo começou a gesticular e a contorcer-se no meio delas num misto de transe e dança impossível de descrever! Era assim que se tornava una com a natureza! Era assim que interpretava os seus sinais, reconhecia-lhe os modos, adivinhava-lhe o destino! Não entendi nada do que ali foi mutuamente transmitido nessa noite, excepto um brevíssimo "não temas!" talvez mais direccionado a mim do que a ela.

Não falámos sobre o que se tinha passado, mas ela sabia que eu a tinha seguido e tinha presenciado o seu encantamento com as serpentes. Possivelmente até teria sido ela que me tinha instado a segui-la, como uma forma de teste às minhas fronteiras psíquicas. O que quer que fosse eu tinha superado a prova e como recompensa Salomé passou a tratar-me duma forma extremamente terna e carinhosa. Dia após dia aproximava-se cada vez mais de mim, cada olhar ia penetrando mais fundo, como se estivesse empenhada em potenciar aos poucos uma loucura difícil de controlar. Nesses dias a sua aura brilhava como nunca, definitivamente dourada, o que a fazia parecer uma deusa no meio dum sol resplandecente. E o ouro que nela via parecia escorrer para cima de mim, deixando marcas e caminhos no meu corpo que ferviam cada vez mais. Era como se me estivesse lentamente a envenenar.

Aos poucos eu deixei de pensar, de ver, de falar em nada que não fosse relacionado com Salomé. Estava de tal forma enfatuada que um dia não aguentando mais fui procurá-la. Ela já estava à minha espera, nua, deitada num belo leito de marfim coberto de finas sedas das mais variadas cores. Vê-la assim, oferecendo-se daquela forma a mim, foi um choque tremendo, que quebrou muitas barreiras, muitas algemas, muitas mordaças e me deixou de tal forma leve que penso que levitei até ao seu lado. O seu corpo estava tão quente, a ponto de ser quase insuportável tocar-lhe! Ela agarrou nas minhas mãos e entrelaçando os seus dedos nos meus beijou-me na testa, nos olhos, no nariz, no queixo e finalmente na boca. Foi aí que senti o meu corpo a aquecer, como se ela estivesse a transferir-me o seu calor, o seu saber, uma parte de si. Aquele nosso enlace parecia-me mais uma iniciação do que um mero ritual de cariz sexual. Os seus beijos tinham lugar marcado, o meu corpo não lhe era estranho e ela aparentava conhecê-lo melhor do que eu própria! Apoderou-se de mim e eu deixei-a entrar, deixei-a saborear-me, provar-me, explorar-me, sorver-me. Ao contrário do que normalmente acontecia não me sentia a esvaziar-me, pelo contrário, a paixão e o desejo iam aumentando, mesmo depois de me ter proporcionado uma série de orgasmos que me iam catapultando para novos e desconhecidos patamares de prazer sexual!

Não sei quanto tempo nos amámos, o tempo parou para mim e durante muito tempo não consegui sequer vislumbrar o que se passou dentro desse casulo temporal que ela teceu à minha volta. Não me podia impedir de sorrir cada vez que me lembrava de Salomé, mas a memória concedia-me pouco mais do que uma vaga sensação de bem-estar. Ainda hoje... é com grande dificuldade que pesco os bocados que ainda me faltam para entender o que correu mal na nossa história.

Acho que ela procurava uma nova Isilda em mim, ou talvez pensasse que a matéria prima era suficientemente moldável para criar algo novo e ainda melhor. Eu sei que mudei em todos os meses que convivi com Salomé. Sei que larguei partes de mim que nunca mais recuperei. E também sei que Salomé se dedicou a tentar fazer de mim a sua maior obra. Cuidadosamente, como outrora a sua mãe tinha feito com ela, arrancou espinhas e espinhos, alisou amolgadelas, lambeu feridas e poliu-me até à exaustão!

Apesar de tudo eu nunca consegui atingir o nirvana espiritual que ela previa para mim. Por mais noites que passasse agarrada ao seu peito, sentindo-a ofegante sobre mim, dentro de mim, não deixava de temer por um fim que eu antevia próximo. Aquela vida de cativa incomodava-me e aumentava uma certa ansiedade que Salomé tentava em vão dispersar. Talvez por sentir que eu me afastava em vez de me aproximar Salomé decidiu recorrer ao seu último reduto, sem saber, ou sabendo mas não querendo ver, que assim acabaria de vez com a nossa história.

Há sempre um momento na vida de todos os amantes fusionais em que um, ou ambos, chegam a uma encruzilhada no caminho comum. E nesse momento ambos têm que querer seguir para o mesmo lado com a mesma vontade e intensidade. Se tal não ocorrer isso representa sempre a morte anunciada da sua relação. O elo mais fraco, caso o haja, pode até ceder e seguir o outro, mas a parte de si que ficou lá atrás não segue com ele e um dia o outro perceberá que o que tem ao seu lado é apenas uma sombra daquilo que um dia teve. Ainda assim há quem tente métodos menos convencionais para convencer a sua amante a seguir o caminho mais longo e mais difícil. Ter usado as serpentes é algo que nunca perdoarei a Salomé, porque tornou a minha luta interior desigual e porque não levou em conta o meu asco aos animais que tanta ligação tinham consigo.

A história dessa noite fatídica não me vem regular e como tal não é fácil descrever com precisão aquilo que se passou. Sei que sentia um calor brutal em mim, mas também não sei se parte dele se devia a tudo o que Salomé já me tinha dito e feito até então. Seria inevitavelmente uma noite de paixão brutal, como outras que já se tinham passado entre nós. Os olhos pretos de Salomé roçavam o vermelho e queimavam os meus à medida que ela se aproximava de mim. Mantendo os olhos fechados com medo que ela me cegasse de vez, entreguei-me ao desejo e à vontade animalesca de me sentir presa de tão sublime predadora. Acariciou-me longamente à medida que me embalava com os seus estranhos e poderosos encantamentos. À medida que me ia sentindo cada vez mais leve e quente não pude deixar de sentir um ligeiro arrepio na perna que me levou a abrir os olhos. E o que vi... uma das suas serpentes, a maior delas todas, dirigia-se a uma velocidade estonteante na direcção do meu sexo molhado e convidativo! Era ali o fim do caminho, a parede feita de grossos tijolos do betão mais duro! Nunca deixaria uma serpente penetrar-me, por muito encantada que estivesse! Com uma destreza que não me julgaria capaz em tais circunstâncias e vencendo o nojo que tinha a tais criaturas, peguei na cabeça da serpente e localizando uma das muitas velas acesas que Salomé mantinha no seu quarto, queimei-lhe a língua! Assim, num só movimento incapacitei-a de jamais voltar a provar um sexo doce e delicado de qualquer outra mulher!

Inesperadamente Salomé desatou a urrar duma forma demoníaca, como se tivesse sido possuída pelo espírito da serpente que jazia moribunda a seus pés. Nesse momento tive medo de morrer envenenada. Tive medo que num acto de vingança fatal Salomé atiçasse o resto das suas serpentes contra mim. Mas naqueles segundos de desespero puro que certamente lhe trouxeram à memória a morte de Isilda e aproveitando que se encontrava ajoelhada tentando reanimar a sua serpente, parti dali para nunca mais voltar!

Demorei muito tempo a recuperar deste episódio insólito e ainda hoje não sei se estarei totalmente curada. Há noites em que ainda sinto um calor estranho em mim, em que os meus sonhos se transformam em pesadelos e só consigo acalmar quando ouço uma voz que me diz "não temas!" e talvez nesses momentos algures no mundo Salomé esteja a velar sobre mim, fazendo-me chegar o seu perdão pelo mal que lhe causei.

E é com alívio que termino esta missiva que se tornou muito mais longa do que eu previra. São assim as memórias, confundem-nos muito, desorganizam-nos e intrometem-se por demais nos humildes fiozitos de pensamento que tentamos manter claros e bem definidos.

Hello my name is Lizzy i'm a Lesbian

terça-feira, novembro 18

Para se divertirem:

http://www.lizzythelezzy.com/

Definitely better!



Seguindo a sugestão da Sara (ou foi da Rita? :-P) no Trio de Lésbicas, chega uma musiquinha para vos (nos) entreter enquanto congemino o resto da história da Salomé!

Salomé - a encantadora de serpentes - parte I

quinta-feira, novembro 13



Por vezes não me apetece brincar com aquilo que sinto conter a verdade mais profunda do meu ser. Nem sempre é bom achincalhar aquilo que não conhecemos porque um dia o amor toca-nos e nesse dia arrependemo-nos de tudo o que (mal) dissemos e fizemos em seu nome. Menosprezá-lo foi para mim uma forma de me defender contra uma força desconhecida. Mas quando um dia o amor me apareceu eu soube que tinha desperdiçado inúmeras ocasiões de introspecção sobre aquilo que o amor era para mim.

Tive demasiadas amantes na vida, pisei mil vezes o risco de me perder nos seus risos fáceis e orgasmos violentos, e hoje penitencio-me através das histórias que me escorrem da memória, guardo-as aqui como folhas secas que se coleccionam ao longo dos anos até que um dia nos esquecemos porque resolvemos preservar tanta insignificância durante tanto tempo.

Embora Salomé não fosse uma mulher insignificante, muito pelo contrário. Foi o caso mais estranho que tive, a primeira vez que partilhei uma mulher na cama com outro ser animado, mas estou já a salivar e ainda nem comecei a pensar naquilo que vou contar, nem como conseguirei deixar retratado o que Salomé deixou em mim. Esta é uma daquelas folhas que tardou a amadurecer e a secar mas penso que estou finalmente preparada para a deixar voar. Quero chegar ao fim do Inverno limpa e nua, igual ao dia em que nasci, antes de todas as ramificações e folhas que de mim brotaram ao longo da vida.

Abordar a mulher que Salomé era será sempre tarefa ingrata, até porque nunca conheci ninguém assim, em tantas e tantas outras que comigo se cruzaram. A mulher era mais do que uma força da natureza, era uma verdadeira instituição, daquelas que sabemos que já existiam bem antes de aparecermos e que continuarão a existir muito depois de não sermos mais do que nuvens de poeira a esvoaçar pelo meio de terras áridas de gente e de vida.

Não foi ela que veio ter comigo, já conhecia bem as suas histórias de encantamentos muito antes de ter tido a oportunidade de a ir procurar. Era uma lenda, um daqueles seres míticos de que ouvimos falar na infância e juventude e sobre a qual tecemos inúmeras considerações e criamos múltiplas fantasias. Salomé era a mulher do Prazer, com P grande, aquela sobre a qual todas falavam e que todos os homens temiam. Segundo a própria nunca tinha tido homem nenhum e isso era motivo de orgulho extremo. Dizia-se filha da terra mãe, gerada por partenogénese no seio duma virgem juvenil que nunca soube porque passados meses dum sonho violento e sanguíneo deu à luz uma menina de tez escura, de olhos tão negros e profundos. Se fosse crente, teria achado que a menina era seguramente filha do demo, mas felizmente para todas nós, a mãe de Salomé tomou o feito como uma dádiva da terra fértil que a rodeava, e tratou sempre a menina com deferência.

Idolatrava-a como se de uma deusa se tratasse, o seu quarto era um santuário, e um local de veneração profunda onde a sua mãe, livre do jugo masculino de um marido que nunca teve, se lhe dedicava em exclusivo. Oferecia-lhe o que de melhor tinha, desde histórias fascinantes sobre mulheres poderosas que viviam e governavam em mundos antigos a canções sobre tudo o que já se tinha passado e o poder dum futuro que ainda estava para vir. A mãe de Salomé não tinha dúvidas que a sua filha teria um grande impacto no seu tempo e na história de toda uma sociedade predominantemente dominada pelos abrutalhados machos da sua espécie. Ela sonhava com uma sociedade desprovida da raiva, agressividade e territorialidade tão presentes naqueles que se engalfinhavam uns com os outros a troco de um punhado de terra, de mulheres ou de filhos. Se ao menos a sua filha aperfeiçoasse a arte de génese espontânea, tal como lhe tinha ocorrido a si infelizmente sem que soubesse como o tinha feito nem como repeti-lo.

Não acreditava em nenhuma espécie de equilíbrio natural que adviesse da junção de machos com fêmeas porque os machos queriam sempre ser dominantes e nunca aceitariam uma mulher que se lhes sobrepusesse em todos os campos. Mais do que isso, ela seria uma mulher que dispensaria da presença masculina de todo! E talvez fosse o que a sociedade precisava depois de tantos séculos de penalização da mulher pela igreja e pelos homens. Como era possível que lhes traçassem (travassem!) o destino invocando a sua culpa exclusiva pelo pecado original? E como era possível terem conseguido enganar tantos milhões de almas durante tanto tempo, tantos homens que usavam e abusavam do complexo de culpa milenar das suas mulheres e tantas mulheres que se lhes subjugavam com medo... de quê??

Foi importante para Salomé que a sua mãe cuidadosamente lhe fosse retirando as finas escamas de culpa que se lhe colavam ao espírito como a todas as outras mulheres do seu (e do nosso) tempo. Assim a menina cresceu forte e destemida, com uma vontade e um desejo inabalável de ser tudo aquilo que pretendia e de viver conforme lhe desse mais prazer. Talvez fosse o seu olhar directo que incomodava os homens que se tentavam aproximar dela. Não se subjugava, não se submetia, não aceitava que não a tratassem como igual, aliás como ser superior que sentia que era. Era mais inteligente, mais astuta, mais brilhante e genial do que qualquer outra pessoa que conhecia. E era bela... de uma beleza rara, pura, imaculada, muitíssimo atraente e sensual.

Ninguém sabia bem o que Salomé fazia, dizia-se que usava os seus poderes de comunicação com os animais para adivinhar a sorte a quem a procurava, e como não eram raras as vezes em que acertava, as pessoas deixavam-lhe tudo o que tinham, casas, terras, fortunas que Salomé distribuía às gentes que viviam em bairros pobres e degradados. Nunca se tinha conhecido uma mulher tão generosa, tinha uma legião de admiradores que muito desagradava aos padres dos lugares por onde passava. Reza a história que um dia um padre a impediu de entrar na sua aldeia porque acreditava que ela era uma bruxa e não a queria perto do seu "rebanho". Ao que ela retorquiu que as bruxas não existiam, que eram uma invenção da igreja para acabar com as mulheres incómodas. E que não percebia porque é que a igreja se intrometia entre si e os que necessitavam da sua ajuda. E quem era que tinha nomeado a igreja retalhista da generosidade e bondade humanas? "Foi Deus..." lá balbuciou o padre, estupefacto com a argumentação da rapariga. "E quem é Deus? Onde está Ele? Já O viu? Já Lhe falou? Como sabe que Ele não me quer aqui?"... ao que o senhor já demasiado atrapalhado se afastou para a deixar passar, pouco habituado que estava a que questionassem as normas da sua igreja.

Com o passar do tempo alguns aventuraram-se a tentar chegar mais perto de Salomé, por vezes usando modos que a ela lhe pareciam demasiado grotescos, agarravam-na, queriam tocá-la e cheirá-la, alguns tentavam beijá-la. A todos ela tratava com uma enervante frieza que desarmava mesmo os mais fervorosos pretendentes. Não havia nada em si que a atraísse a tal espécie, nada lhe agradava nos seres humanos que a rodeavam. Cheiravam mal, não se cuidavam minimamente. Nem sequer conseguiam manter um discurso coerente, rapidamente davam mostras de falhas de raciocínio imperdoáveis. Salomé começava a convencer-se que seria um ser assexuado, indiferente que se sentia a qualquer ser de qualquer sexo. Até que um dia A encontrou, essa que foi a sua primeira (e há quem diga única) paixão. Isilda era uma mulher frágil que tinha padecido de um rol infindável de doenças desde a sua mais tenra infância. Via-se que podia ter sido uma mulher muito bela, mas tanto sofrimento tinha-a feito encolher ligeiramente. Era tão pálida que parecia quase transparente e eram raras as pessoas que se aproximavam por acharem que ela não seria seguramente deste mundo. Parecia um ser lunar, algo entre este mundo e outro qualquer desconhecido e assustador. A clareira que se formava sempre ao seu redor intrigou Salomé que quis conhecer aquela mulher quase translúcida de onde emanava uma aura muito intensa de cor violeta. Percebeu mesmo sem falar com Isilda que ela tinha muito para lhe transmitir e não mais a largou.

Isilda podia parecer fora deste mundo mas uma vez ultrapassada a barreira que a separava do mundo era uma mulher extraordinariamente fogosa. A fragilidade transformava-se em sensibilidade que dava lugar a uma quente sensualidade. A sua pele azulada alaranjava-se com a presença tão física e tão forte de Salomé. O beijo que as uniu foi fatal. Salomé percebeu que afinal era um ser sexual. E Isilda percebeu que tinha acabado de se apaixonar tão perdidamente que doravante seria a sombra de Salomé. Para onde uma fosse a outra seguiria. Salomé passou a ter 2 pares de olhos, 4 braços e 4 mãos estendidas na direcção dos mais carenciados.

E à noite na cama... digo eu que nunca as vi juntas sequer... à noite na cama dormiam tão juntas que uma não se distinguia da outra. A cor da pele de Isilda mudava de tom, feito camaleão e eram as duas uma massa só, uma só respiração, um só bater de coração. Nunca se vira uma relação assim em lado nenhum. Salomé adorava aquela mulher, amava-a tremendamente e tentava ser de tudo um pouco na relação, amiga, irmã, mãe e amante. Ia colmatando em Isilda todas as emoções que sentia que a mulher nunca tinha experimentado. Dava-lhe tudo... e daria a sua própria vida por ela mas infelizmente todos os cuidados que Salomé tinha com Isilda não foram suficientes para a tornar diferente do amalgamado de doenças em que ela se tinha convertido.

Um dia, numa noite fria de Inverno, Isilda não mudou de cor ao instalar-se na cama ao lado de Salomé. A sua tez azulada manteve-se assim como a sua respiração fraca e entrecortada de pequenos soluços. Os vários animais que seguiam Salomé para toda a parte transmitiam-lhe que o fim de Isilda estava próximo mas ela não os queria nem ouvir! Mas Isilda faleceu nos seus braços nessa noite e Salomé percebeu que afinal o seu poder não era ilimitado. Foi a maior decepção da sua vida, e abriu nela uma fenda tão profunda que nunca mais foi a mesma. Deixou entrar nela sentimentos que a sua mãe tanto se tinha esforçado por afastar, a raiva, a culpa, a amargura, o desespero. Pela primeira vez na vida chorou, chorou tanto que teve medo de se esvaziar de todos os sentimentos que um dia tinha nutrido por Isilda. Mas o tempo, esse tempo que dizem tudo curar, ajudou-a a enfrentar uma vida sem Isilda.

No entanto, nas noites frias de Inverno, e depois nas quentes de Verão também, passou a não suportar a solidão da sua cama vazia e desde o momento em que deixou de chorar Isilda passou a seleccionar companheiras que a fizessem lembrar de Isilda e que lhe aquecessem o corpo como Isilda fazia. Foi nessa altura que a lenda de Salomé enquanto amante insaciável começou a circular e chegou aos meus ouvidos. Diziam que nunca tinha querido um homem, não sabia o que fazer deles, nem com eles. Acreditava que se um dia tivesse que ser mãe o seu corpo se encarregaria dessa tarefa, sem precisar de parte alguma doutro ser humano. As mulheres que consumia eram apenas um ligeiro consolo à dor que ainda sentia pela morte de Isilda, e pela sua impotência perante tamanha transição. Ainda assim todas as que com ela se deitaram passavam a adorá-la ainda mais do que antes. Metade ou um terço de Salomé ainda era dose suficiente para as inflamar de um desejo e de uma paixão tal que nunca mais a esqueciam.

(A continuar, assim que me recompuser desta já de si longa missiva!)

One step forward, two steps back

quinta-feira, novembro 6



Parecia-me uma aberração, mas não... afinal há homossexuais conservadores, arrisco quase a dizer que de extrema direita, que são contra a legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo. Tentando descortinar os argumentos, chegamos à ínfima resposta... "Porque sim! Porque o casamento é só entre um homem e uma mulher, foi assim que ficou destinado desde sempre!" (por quem? Por Deus?...) E "porque as relações heterossexuais são diferentes das homossexuais" (certo, também concordo com isso, mas não se nesse "diferentes" está subentendido um "inferiores"...) logo não podem ser tratadas da mesma forma.

Vale a pena argumentar? Confesso que fiquei um pouco abismada com a falta de abertura da criatura. E com o namorado ali ao lado a olhar para ele com cara de desconfiado. Não me parece que o assunto seja consensual entre ambos, mas enfim... eles saberão deles e nós por cá continuamos, não sei se deva aceitar uma união civil com os mesmos direitos, cheira-me que isso é aceitar que a minha relação é de facto inferior às relações entre heterossexuais. E como pelos vistos nem sequer é consensual no seio da própria comunidade, se calhar era melhor comer e calar. Será melhor termos uma união civil registada do que nada? É parvoíce ou estupidez continuarmos a lutar por um direito que muitos homossexuais nem sequer acham que devíamos ter?

Para mim a coisa é clara como a água, sempre foi desde que me conheço. Infelizmente vivemos numa sociedade heteronormativa, remar contra a maré cansa... e eu só quero é chegar a casa um dia e pegar na minha namorada e fazer dela minha mulher. Agora se nos "casamos" ou nos "unimos civilmente"... são só expressões, ou não é?

Let's go party!!

quinta-feira, outubro 30



E porque "enquanto o pau vai e vem folgam as costas" (lembrei-me agora do provérbio ao olhar ali para a menina do anúncio! :-P) porque não irmos arejar mentes e corpos neste novo espaço que vai abrir em Cascais amanhã?

Stop the press!!!

quinta-feira, outubro 23




O sucessor do líder populista Joerg Haider, Stefan Petzner, chocou a conservadora Áustria ao afirmar que mantinha uma relação amorosa com o falecido líder do BZOe, que morreu no dia 11 de Outubro num desastre de automóvel. Numa entrevista radiofónica, o novo líder, de 27 anos, confessou que Haider era "o homem da sua vida".


Quantos mais casos como este serão precisos para o mundo entender que os maiores homofóbicos são também os maiores homossexuais reprimidos da história? São aqueles que não se aceitam como são, que se castigam e martirizam por serem como são e ao fazê-lo estendem os castigos aos outros, sobretudo àqueles que vivem melhor com a sua homossexualidade. Odeiam-se tanto que destilam ódio por tudo o que mexe e é aparentemente feliz!

Depois têm estes finais trágicos (mas nem sempre) e depois o mundo fica “chocado” quando se apercebe que afinal às virtudes públicas se somam (muitos e muitos) vícios privados. É uma tristeza! E deveria ser uma lição para todos os que acham que podem esconder uma vida dupla se publicamente se afastarem o suficiente daquilo que no fundo até são e até gostam! Cambada de hipócritas e cobardes!!

E por cá quem é que vocês acham que tem esqueletos no armário? Quem resistiria a escrutínios sobre a sua intimidade? José Sócrates? Marcelo Rebelo Sousa? Paulo Portas? Pedro Santana Lopes? Já para não falar da Sra. Dona Manuela Ferreira Leite....

Nós cá somos ignorados e eles lá votam

quarta-feira, outubro 15



Gostava de ser americana e californiana no próximo dia 4 de Novembro. Gostava de poder votar por um tipo que se diz liberal e apoiante da causa LGBT (pelo menos até ser eleito) e de votar contra uma estúpida proposição que alguém com muito dinheiro (possivelmente alguma igreja daquelas obscuras) inventou para ilegalizar os casamentos entre pessoas do mesmo sexo que já são legais no estado da Califórnia desde Junho deste ano.

Contrariamente a tudo o que se ouve e diz, que os direitos das minorias não se prestam a referendos, eles lá vão referendar a tal proposição 8 e a coisa tá renhida pelo que não sei o que irão fazer em relação aos casais de pessoas do mesmo sexo que já deram o nó desde Junho até hoje. Provavelmente converterão os casamentos em “uniões civis” ou algo similar mas não igual, e assim se perderá uma batalha que já julgávamos ganha, ainda que num país e num estado bastante longínquos do nosso.

É triste porque deveria haver uma clara evolução, será sempre de (des)esperar que as coisas demorem o seu tempo, mas pelo menos as alterações que se façam que sejam no sentido de dignificar um grupo não negligenciável de pessoas, de lhes facilitar a vida, facilitando-lhes o acesso aos mesmos direitos que a todos os outros.

Espero que um dia este tema vença o resto da sociedade, nem que seja pelo cansaço e pela falta de argumentos, já que a religião não é para aqui chamada e até ver o direito à procriação não é um exclusivo dos heterossexuais.

Nós queremos ter os mesmos direitos, queremos casar com a pessoa que amamos e com quem vivemos e queremos ter o direito de constituir família com a pessoa com quem casamos. Parece simples não é? Se deixarmos a religião fora da equação não percebo porque é que não é simples... porque é que o nosso estado sendo laico e socialista continua a impedir o acesso a direitos tão básicos como o casamento e a constituição duma família a um milhão dos seus cidadãos?

Queres Igualdade de Direitos?

sexta-feira, outubro 10

TOMA!!!

Hoje não é um bom dia para pelo menos 342 pessoas




Da minha sondagem de trazer por casa chego à conclusão que pelo menos 171 pessoas que se assumem como homossexuais gostariam de se casar com as suas caras-metade pelo que em nome de todas essas pessoas e dos seus pares daqui dirijo uma única palavra aos deputados que não tiveram coragem para votar favoravelmente a alteração à lei sobre o casamento civil: "Vergonha!!"

É uma vergonha para todos nós e para o nosso país que centenas de pessoas, senão milhares, continuem a ser excluídos de um direito básico que é um dado adquirido para todos os outros cidadãos, é uma discriminação, é uma forma legal de homofobia, de manter os homossexuais no armário, de lhes dizer que são tolerados desde que continuem bem trancados nas suas casinhas e não incomodem o resto do pessoal.

É uma vergonha que deputados e deputadas eleitos com o voto de todos nós não tenham tido coragem de enfrentar os órgãos partidários e impor-lhes uma visão que todos sabemos ser a sua, porque já deram a cara por uma causa que agora vergonhosamente renegam. Olhem para o chão senhores, porque não acredito que consigam continuar a olhar nos olhos daqueles que juraram defender!

Sondagem de trazer por casa

quarta-feira, outubro 1

Em relação ao debate sobre o casamento dos homossexuais tenho ouvido por aí opiniões contraditórias, algumas inclusive de homossexuais que acham que é uma parvoíce o grupo, ou comunidade LGBT, ou o que queiram chamar-lhe, estar a lutar por um direito que no seu ponto de vista não faz sentido para quem se proclama homossexual. E penso cá para comigo que se este assunto não é consensual nem entre os meus "pares", temo que nunca o será duma forma mais alargada.

Assim peço-vos para votaram nesta sondagem de trazer por casa para aqui neste cantinho percebermos se realmente estamos todos a lutar pelo mesmo ou se nem por isso...

Porque rir é sempre um bom remédio!

segunda-feira, setembro 29

Opá este fim de semana descobri esta peróla e ainda não consegui parar de rir!

YouTubeis e procureis por "Bicha do demónio".
Aqui fica uma piquena amostra:

Ventos de mudança

quinta-feira, setembro 25

Para quem não viu a reportagem da RTP ontem aqui fica o link:



"Certo é que são realidades crescentes, cada vez mais assumidas e incontornáveis."

E parabéns à RTP pela forma aberta e sensível como abordou o assunto das famílias compostas por dois pais ou duas mães.

"I Have a Dream"

segunda-feira, setembro 22



Agora que os ABBA voltaram a estar na moda não posso deixar de sorrir quando torno a ouvir esta música que há trinta anos atrás para mim não passava de uma melodia de sonoridade fácil. Na verdade já não acredito em anjos nem que todos têm uma parte boa dentro de si. Há pessoas muito invejosas, muito mesquinhas, muito ciosas de algo que não é seu e acredito fervorosamente que um dia tudo irá mudar, infelizmente não creio que seja brevemente. Não há vontade política dizem uns, eu acho que será mais porque a classe política portuguesa é extremamente facciosa (salvo raras excepções) e muito machista. Parece que voltámos aos tempos da rainha Vitória que acreditava que o lesbianismo era coisa de ficção e que tolerava os homossexuais desde que não lhe assustassem os cavalos!

Em vez de marcharmos com confiança em direcção a um futuro de liberdade, respeito e tolerância, voltamos atrás. Discute-se, debate-se, fala-se e escreve-se muito sobre a homossexualidade mas ninguém conhece a realidade das histórias de amor que se passam por trás da cortina da normalidade imposta por uma sociedade que se diz tolerante mas que não dá passo nenhum no sentido de o ser. Afinal há quantos anos a discriminação com base na orientação sexual passou a ser condenada pela nossa constituição? E porque é que descriminar um casal com base no sexo de cada um no acesso ao casamento civil não é também condenável, assim como seria descriminar um casal em que um dos elementos tivesse uma cor diferente do outro?

Estou descrente, o meu sonho existe mas não acredito puder vir a concretizá-lo em vida, pelo menos não no nosso país. Eu vivo uma bela história de amor igual à de tantas outras pessoas mas diferente de todas as outras porque é a minha. A minha mulher é minha porque um dia eu encontrei-a e escolhi-a assim como ela me escolheu a mim e demos todos os passos no sentido de nos tornarmos um casal, namorámos, demo-nos a conhecer, amámo-nos louca e apaixonadamente e decidimos finalmente ir viver juntas. Se fosse permitido por lei o próximo passo, lógico para ambas, seria o casamento civil.

Não porque isso mudasse uma vírgula que fosse à nossa única e maravilhosa história de amor. Apenas porque o nosso tempo aqui é finito e nós sabemos que daqui a vinte ou trinta anos outros valores poderão vir interpor-se entre aquilo que hoje estamos a construir a duas. Se eu ficar inválida ou quando morrer, quero que tudo o que é meu seja dela e sei que mesmo que faça um testamento em seu favor isso poderá não ser linear. Ninguém neste mundo quer saber da minha única e maravilhosa história de amor a não ser nós as duas mas um dia que uma de nós falte à outra... e é só nesse sentido que eu queria casar-me com ela, para que perante a sociedade civil ela tivesse um estatuto igual àquele que já tem (e sempre terá) para mim. Ela é a minha mulher, de corpo e alma. É o meu passado, presente e futuro. E mesmo que me digam que eu não devia nem querer saber o que se passará depois de mim, eu preocupo-me por ela e pelo que ela terá que passar um dia sem mim. Há barreiras que o amor não chega para transpor e a morte é uma delas.

Posso continuar a sonhar em ter um casamento de sonho, assim como contínuo a maravilhar-me com contos de fadas, mas isso não chega para acreditar que um dia o nosso país irá evoluir. Ainda assim sei também que as nossas histórias de amor se irão continuar a escrever porque o amor verdadeiro encontra sempre um caminho, mesmo que seja um caminho muito diferente e bastante mais complexo do que o usual. E isso não vai mudar, mesmo que no dia 10 de Outubro continue tudo tal como está.

Chorar sobre leite derramado

quarta-feira, setembro 3



Bem sei que já se passou mais de um mês mas Agosto tem destas coisas e o tempo quente que se faz sentir lá fora não é amigo de quem se refugia nos meandros da leitura e da escrita, muitas vezes para escapar a uma realidade que é demasiado branda para se servir a seja quem for que aqui venha à espera de um tónico, de preferência com gelo. E também sei que há exigências mínimas e é bom que assim se mantenham porque escrever com o intuito de entreter não é para qualquer uma e só as mais corajosas se atrevem a dar esse passo sem saberem o que as espera do outro lado.

No entanto nem sempre se consegue manter um controlo cerrado sobre aquilo que se produz... e muitas vezes somos expostas a más interpretações que arrasam toda uma reputação, muitas vezes ainda antes de nos dispormos a ir mais longe do que aquilo que ambicionamos. E para não massacrar mais as que aqui passam depois de umas férias bem merecidas e espero que bem passadas, passo a exemplificar daquilo que falo de modo menos críptico e mais passional.

Embora seja um facto que não me importa agora, nem me importou nunca, aquilo que pensam sobre mim porque eu não sou mais do que um fugaz nada que se ilumina por brevíssimos momentos e que se irá apagar um dia sem que o mundo lá fora dê por isso. Achar que o que faço ou digo tem relevância seria dar-me demasiada importância e eu sei bem o lugar que ocupo no grande esquema do universo (credo que agora até pareço um desses evangelistas do advento!) E não sou nada disso, apenas gosto de contar histórias para me manter entretida!

Bem dizia a minha avó que não se deve brincar com o fogo porque o fogo queima fazendo-o por vezes com artes e engenhos que não lembraria ao próprio diabo. Fui devassa na minha juventude, e tive daqueles momentos em que nos julgamos donas e senhoras do mundo e de algumas pessoas que nos rodeiam. É tão fácil achar que estamos na crista da onda, quase tão fácil como achar que estamos no mais fundo dos caixotes de lixo da vizinhança e arredores. Uma miúda assumidamente lésbica numa terra onde ainda nem se sabia bem o que isso era... imagine-se! Os homens olhavam para mim com desconfiança e natural curiosidade. As mulheres admiravam-me! Eu que andava por ali a espalhar aos quatro ventos que não precisava de homem nenhum, que estava perfeitamente bem sozinha, que filhos nem vê-los porque só trazem problemas e chatices, um dia... apaixonei-me! Tão profundamente que deixei de me reconhecer nas coisas que lhe dizia, e muito menos nas coisas que lhe dizia que por ela faria! Com Clara desaprendi tudo o que sabia e posso mesmo afirmar que ela mudou a minha vida completamente. É engraçado e talvez até interessante verificar como mudam os nossos percursos de vida após certos encontros que nos marcam indefinidamente. Mas na altura a coisa não se prestava a nenhum tipo de análise concreta e racional. A Clara passou a ser o meu motivo e modo de vida.

Claro que hoje sei o quanto ela se regozijava com isso! Deve dar uma noção de poder enorme saber que se mantém um ser vivo escravizado por todas as suas vontades e caprichos. E o amor torna-nos de facto cegos, e estúpidos. Mas também se assim não fosse quem se atreveria a abrir a sua intimidade por vezes tão cuidadosamente preservada a um perfeito estranho?

Clara estava na aldeia de passagem, numas férias que ela entendeu prolongar quando se apercebeu do efeito que tinha em mim. Calculo que não fosse difícil entender até onde eu pretendia chegar, calculo que ela se apercebesse perfeitamente das subtis mudanças de intensidade no meu olhar quando se acercava dos seus melhores e mais avantajados atributos. Tantas vezes me perdi naqueles decotes intencional e escandalosamente descaídos para provocar. Se dúvidas houvessem, e eu nessa altura já não tinha nenhumas, passaria a saber muito bem qual é a parte do corpo da mulher que acende aqui o meu pequeno foguetão interior. E que par, senhoras, que par! Que se chegue à frente a mulher que nunca olhou para um belo par sem segundas intenções! Ainda hoje tremo só de pensar... na obsessão que se tornou em mim puder abraçar aquele par e cheirar aquele cheiro doce e quente... e tocar naquela pele que é a mais suave e macia que se pode encontrar... e saborear o suor que por vezes ali escorre, mais doce que salgado, mais mel do que fel...

Não era só disso que se tratava o meu súbito interesse por Clara, mas foi por aí que tudo começou. Foi esse o seu atributo que me levou a sonhar com noites infindáveis de paixão e de prazer. Era ao meio dessas montanhas que eu almejava chegar, percorrendo caminhos onde me sonhava destemida pioneira, só as minhas mãos, os meus dedos e a minha língua poderiam sobrevoar e aterrar naqueles picos que adivinhava tesos através dos decotes indecorosos de que Clara abusava. E sempre que a convidava para o proverbial café, todas as tardes quando a avistava no seu passeio diário do meu poiso na oficina onde então trabalhava, ela aceitava com uma acentuada reclinação do regaço que não deixava margem para dúvidas, a fala evaporava-se, e tinha mesmo que me forçar a respirar tentando não perturbar a visão do que ela ali me expunha.

Assim se passaram semanas, ela provocando-me e eu tentando arranjar uma deixa, um motivo, qualquer coisa inteligente que me permitisse chegar mais perto dela e mais longe do que todos os seus outros amantes. Clara tinha um passado pejado de homens, ou pelo menos ela assim o apregoava. E nesses instantes alguém, eu própria, deveria ter concluído que eu seria apenas mais uma estaca nessas outras tantas que ela já enterrara no campo dos amantes passados. Mas na inquietação dos meus verdes anos achei que se ela se desse a provar a uma mulher nunca mais iria querer saber de homem nenhum. E foi por meias palavras, talvez mais por olhares e tocares, que lhe dei a entender que a queria no sentido bíblico pois porque não são só o homem e a mulher que se deitam juntos para se amarem. Duas mulheres também se podem amar assim, atingindo profundidades no prazer que não são equiparáveis a nada mais que exista no mundo das emoções e sensações. E quem não tem conhecimento de causa não pode opinar sobre o que nunca lhe passará pela cabeça, corpo e alma.

Um dia Clara perguntou-me se eu era virgem. Assim sem mais outro assunto entre nós que não o estado do tempo ou os seus afazeres na grande cidade. Ao que eu visivelmente corei porque não sabia como explicar-lhe que era virgem no sentido de nunca me ter deitado com um homem, mas que não me sentia virgem por já ter estado com várias mulheres e já ter conhecido os prazeres do sexo sem condicionantes nem limitações. Provavelmente seria a mulher mais sexualmente activa da aldeia e no entanto muitos me consideravam virgem por nunca ter tido um namorado! Eu respondi-lhe que sim e não sabendo que uma resposta dessas não serve a quem quer chegar ao fundo das questões. Mas naquele momento serviu para me refrescar a alma no seu riso cristalino e contagiante. "Não digas mais nada..." falou a voz da experiência. "Tenho pena porque um dia vai-te fazer falta." Assim! Sem mais! E eu indignada! "Falta porquê?? Ora essa!" E era ela que me vinha dizer que deixar de ser virgem, com um homem, era coisa que me ia importar no futuro! Nesse ponto posso categoricamente afirmar que ela estava redondamente enganada! Nunca me fez falta um homem, em termos sexuais, emocionais, financeiros, racionais ou outros que tais. Felizmente sempre consegui viver a minha vida sem homem algum ao meu lado e isso é algo de que me orgulho particularmente porque sempre me disseram que uma mulher sozinha, ou mesmo acompanhada de outra, nunca chegaria a lado nenhum.

Quase deixei de lhe falar por isso mas hoje acho que ela o disse só para me espicaçar ainda mais. Como se uma mulher precisasse mesmo de um homem, como se um homem fosse aquilo que ela precisava deixando no ar que eu era uma mera distracção casual. E a partir daí eu esforcei-me para lhe mostrar que não acreditava nessa sua mentalização sexista, porque o mundo e a sociedade estavam a mudar, e as mulheres já não precisavam de um homem para as proteger e sustentar. E quanto mais eu tentava mais ela se ria de mim, e mais eu me enredava, prisioneira daquele riso cristalino e daqueles seus atributos que não me deixavam parar de sonhar.

Um dia Clara teve que voltar aos seus afazeres citadinos, mas nem por isso pararam os meus sonhos. Por muitas noitadas que fizesse tentando perder-me noutros corpos e noutros cheiros, não conseguia libertar-me da imagem de Clara, gozando-me, provocando-me, assegurando-me que um dia um homem me viria cravar uma estaca apagando assim o meu fogo e matando aquilo que eu considerava ser a minha essência.

Mas chegou uma carta e não era daquelas cheias de baboseiras que as miúdas doutras aldeias me costumavam enviar. Era uma carta seca, profissional, convocando-me para uma reunião num escritório de advogados na cidade. Só percebi que era dela pela assinatura no fim. Impressionante... e intimidante! Quereria ela apresentar-me a algum fulano dos seus conhecimentos? Quereria ela iniciar-me nesse mundo sexual que ela dizia tão bem conhecer? Fiquei apavorada mas peguei nesse meu lado imprudente e fui!

O meu encontro com Clara a sós... havia meses que sonhava com aquele momento em que podia finalmente senti-la no meus braços. Entregue a mim e submissa. Rendida aos meus encantos e charmes. E não há sempre momentos em que nos sentimos vitoriosos e confiantes? Em que nada pode correr mal porque sabemos e conhecemos as nossas capacidades e sentimo-nos à altura deste mundo e do outro? Eu era assim, a entrar no que efectivamente me parecia um escritório e a olhar para Clara semi-desnuda, sentada numa chaise longue olhando para mim daquela forma lânguida e pré-coital que eu conhecia tão bem. "Mostra-me o que sabes fazer..." e aquilo foi música para os meus ouvidos! Esqueci passado e nervosismo e empenhei-me em mostrar-lhe como eu sabia amar uma mulher. Adorei e reverenciei devidamente os seios generosos que pela primeira vez podia tocar e cheirar e beijar. Eram tal como tinha sonhado mas em mil vezes melhor, porque há uma componente substancial que nem em sonhos conseguimos alcançar. Talvez seja um regresso à tenra infância, a memórias tão longínquas guardadas em bocados fragmentados de nós, que nos leva a querer tanto esse contacto, nesse preciso lugar onde um dia fomos alimentados e embalados por quem nos quis mais do que ninguém.

Ela libertava-se por baixo de mim, sentia-a vulnerável, aberta aos avanços que eu tinha delineado. Não sem antes a beijar pela primeira vez e assim selar aquela paixão que me tinha consumido durante tantos meses. E nela era tudo bom, um verdadeiro festim sensorial!

Sentindo-a favorável, apressei-me para chegar lá onde eu queria e ela facilitou-me o caminho, abrindo as pernas e deixando-me chegar mais perto do seu sexo que já tinha sentido abundantemente humedecido. Estava já no meu auge e sabia que podia levá-la comigo mas de repente... leite! Era leite o que escorria do seu sexo oferecido! Nunca tinha visto nada assim e espero nunca mais nada assim ver! Um líquido espesso e branco... que hoje sei ser proveniente do marido que a agredia e violava quase diariamente!

Perante aquele cenário chorei, e sempre que me lembro de Clara choro novamente. Não consumei o acto, não fui capaz perante tamanha evidência de actos recém passados. Pedi-lhe desculpa, disse-lhe que se quisesse experimentar uma mulher que procurasse outra porque eu não iria conseguir abstrair-me desse leite que escorria entre nós. E assim acabou essa história que tanto me marcou. Muito do que chorei, e do que ainda hoje choro, se remete a esse leite ali tão vilmente derramado!

2º Aniversário - Lesboa Party

quarta-feira, agosto 20


Lá estarei!!!

terça-feira, julho 29


De férias, com o espírito e o corpo a precisar de descanso, vejo numa tabacaria uma nova revista... Levo-a, à espera de ver a coragem estampada numa publicação nacional que já fazia falta: uma revista Gay!

Chego à praia, espalho as tralhas e dedico-me a desvendar sofregamente todos os recantos da dita, sempre à espera de uma surpresa, sempre à espera de algo novo. Ouvi reclamações jocosas de falta de atenção, mas eu estava determinada. Depois de umas horas a fritar para a análise não ser injusta, desisti. Sempre as mesmas caras, sempre as mesmas histórias, sempre o mesmo recanto lisboeta que se corre numa horita..

Bem sei que é o primeiro número e que a minha opinião corre o risco de ser bombardeada de críticas, porque à falta de tudo não se pode reclamar. Esta minha opinião vai no sentido de dizer que quem tem a coragem, o investimento até monetário de se meter numa destas, que vá em frente a fim de desvendar o que o mundo gay/lésbico português (e não só) tem de novo para mostrar e para dar.

Têm agora a faca e o queijo na mão. Descubram e dêem a conhecer aquilo que não sabemos. Explorem! Estamos tod@s à vossa espera!!!

Antes perneta que maneta!



Esta noite tive um daqueles sonhos bizarros em que passado e futuro se misturam sem nenhuma coerência nem consistência mas que me deixou a cismar com uma história que se passou aqui há uns anos quando eu por incúria ou idiotice me deixei envolver com uma mulher “casada”. Eu sempre disse e continuo a dizer que não é correcto investir nesse tipo de relacionamentos até porque há vários cenários possíveis e nenhum deles interessa a todas as partes envolvidas, pelo menos não na actualidade social deste cantinho soalheiro onde vivemos. Isto trocado por miúdos significa que olhar é normal porque ninguém é cego e o que é belo é para ser apreciado, pois claro! Mas daí a dar o passo e entrar numa intimidade que não é nossa em exclusivo, isso já requer uma mestria emocional que a mim me ultrapassa. Sou da velha escola e acredito na exclusividade das relações até porque não acredito na capacidade dos seres humanos em gerirem uma proliferação de afectos para além desse único e especial que nos liga à pessoa da nossa vida, pelo menos no momento presente.

Bom mas da única vez em que cometi o erro de meter a colher entre mulher e mulher apanhei um susto tão grande que jurei para nunca mais! É certo que a mulher da mulher não era uma mulher qualquer. E é certo que eu trazia uma paixão assolapada por ela já desde os tempos de liceu. E é certo também que eu por vezes achava que a Lucinda me dava troco, fosse por certos olhares mais intensos, fosse por uma mão propositadamente deixada sobre o meu braço queimando-me a pele e deixando-me à beira do desespero. E ela era uma mulher muito bonita, de pele espontânea e clara e de olhos translúcidos e directos, e eu já aqui confessei que não sou insensível à beleza magnética de certas mulheres.

Mas a Lucinda tinha uma prometida, sempre teve desde que nos tornámos gente. A Ana Isabel era uma espécie de sombra, onde estava a Lucinda ela aparecia atrás, sempre vigilante, sempre protegendo a eleita do seu coração. Não era possível dissociar uma da outra, de tal forma se moviam juntas para todo o lado. Já na altura era uma escandaleira lá na terra porque elas sempre se declararam namoradas e não queriam saber das conversas de pais, padres e psicólogos que lhes diziam que não era possível terem tanta certeza da sua sexualidade sendo tão novas. Chegavam a pedir-lhes que experimentassem com fulano e sicrano, garanhões de serviço, antes de se comprometerem dessa forma tão explícita! Como se a experimentação de um prazer não desejado pudesse de alguma forma mudar o que não pode nunca ser mudado! Quanto mais insistiam para que se separassem mais elas insistiam que nunca jamais em tempo algum nenhum ser vivo se intrometeria na sua irmandade de sexo e de sangue.

Então porque foi que um dia a Lucinda apareceu sozinha na oficina da Ana Maria pedindo para falar comigo como se a sua vida dependesse disso? Então porque foi que a Ana Maria achou por bem encontrar um ponto de encontro secreto onde Lucinda e eu pudéssemos aprofundar laços que eu unilateralmente já lhe lançara? Então porque foi que eu sabendo que a Lucinda não me pertencia fui ao seu encontro de braços e coração abertos, querendo saber porque era que ela me queria, como era que ela me queria e porque não antes, antes do “casamento”, antes desse tempo todo em que eu tinha tentado enterrá-la nos baús das memórias do meu passado? Não sei. Apenas sei que fui querendo apertá-la nos meus braços e dizer-lhe que eu sempre a tinha amado e desejado muito, apesar da outra.

Lucinda estava triste, um pouco cabisbaixa e apática, como se tivesse chegado a um beco sem saída. A sua vida não era aquilo que ela queria, disse-me. Algures no tempo tinha deixado de governar as rédeas da sua vontade e tinha cedido o seu lugar a uma outra cavaleira, mais destemida e assertiva do que ela. Durante anos cedeu a tudo, deixou-se levar por uma existência confortável e desafogada. Até ao dia em que se olhou ao espelho e não se reconheceu naquele ser de aparência indiferente e desleixada. A vida deixou de ser vida, passou a ser uma sucessão de dias, minutos, todos iguais uns aos outros, todos cinzentos, indistinguíveis, frustrantes, sufocantes minutos em que nem força sentia para se debater contra algo que se tinha apoderado daquilo que ela era deixando-a feito esqueleto de si própria.

A minha Lucinda que não era minha excepto nesse brevíssimo momento em que se agarrou a mim e me pediu que a salvasse duma vida que não era vida. Vamos, pedia-me, fugimos as duas, passamos a fronteira, vamos viver bem longe desta terra e desta gente, e dela... da outra que a queria sem a querer deixar ser aquilo que ela era. E eu por um momento sensível ao seu desespero dizia-lhe que por mim sim, fugíamos pois, nós sem dinheiro mas qualquer coisa se arranjaria nem que eu tivesse que me ir oferecer à beira da estrada aos indigentes que por ali passavam desejosos duma foda apressada. Ela chorava agarrada a mim e nesse momento os nossos lábios tocaram-se e sofregamente nos beijámos. E eu senti que a amava, intensamente, terrivelmente, desesperadamente iria tentar fazer o impossível para me juntar aquela Lucinda que não era minha.

Combinámos encontrarmo-nos todos os dias dessa semana, e todos os dias fazíamos planos, traçávamos caminhos de fuga para amanhã, ou depois, ou seguramente um dia muito próximo do seguinte. E amávamo-nos loucamente, com uma intensidade que nunca tinha sentido até então no meio de juras desse amor eterno que esperava por nós um dia, bem longe de tudo e de todos. Os dias passaram, a loucura manteve-se durante todo o verão até que um dia... ninguém sabe como, ninguém sabia, ninguém vira, ninguém comentara, mas um dia a Ana Isabel apanhou-nos juntas. Ainda me lembro da sua cara transtornada, das veias do pescoço a pulsarem furiosamente à medida que ela arrancava Lucinda dos meus braços e depois me empurrou num vértice de violência desmesurada, pontapeando-me e esmurrando-me, querendo apagar de mim memórias que eram só suas, da sua intimidade de casal onde eu nunca pertencera e de onde era agora selvaticamente expulsa.

Senti o sangue a jorrar-me nariz e boca adentro, o seu gosto acre a contrastar com o sabor doce dos beijos da Lucinda que nesse dia morreu para o mundo e para mim. Apanhei uma carga de pancada tão grande que julguei que nunca mais me levantava. E nesses momentos em que estive entre a vida e a morte sufocando no meu próprio sangue que me inundava as entranhas, jurei que tinha sido a primeira e última vez. Foi a Ana Maria que me salvou, me encontrou naquele estado e me levou para as urgências para que me cozessem rasgões e concertassem fracturas. A ela devo-lhe a vida e à minha avó a clarividência de espírito com que tentou confortar-me na primeira visita que recebi no hospital. Depois de avaliar os estragos nos meus membros inferiores a minha querida avó virou-se para mim a sorrir e disse-me "na difícil arte de amar mais vale perneta que maneta minha filha, nunca te esqueças disso, mais vale perneta que maneta!"

Arriba el rollo bollo!

terça-feira, julho 8




"Gran participación en los actos del Orgullo LGTB 2008

Cogam, Colectivo de lesbianas, gays, transexuales y bisexuales de Madrid, agradece a los más de dos millones de personas que han participado en los diferentes actos del Orgullo LGTB 2008 en Madrid.

COGAM, considera un éxito la participación ciudadana (estimada en un millón cien mil personas a las 20:00) en la convocatoria estatal de la Manifestación del Orgullo LGTB 2008 con lema "por la visibilidad lésbica". A lo largo de la manifestación se han gritado consignas como "arriba el rollo bollo", "bollo a la vista", "lesbiana se escribe con v de visible", "en las aceras también hay bolleras", …

La manifestación del Orgullo LGTB se ha convertido de facto en el evento más multitudinario que se da cita anualmente en la ciudad de Madrid, siendo la mayor exhibición de diversidad, solidaridad, tolerancia y multiculturalidad.

Como novedad este año se realizó una Caravana del Orgullo, que recorrió los municipios de Getafe, Fuenlabrada y Alcorcón y fue recibida por los diferentes alcaldes de estos municipios. Dado el éxito de esta iniciativa, se repetirá anualmente."


E foi assim que num escaldante final de tarde a multidão se levantou feita touro enraivecido e pateando o solo fez a terra estremecer. E levantando os cornos plenos de orgulho traçou no ar rotas de liberdade que conduzirão os povos à nova democracia!

Pelo menos uma vez na vida toda a gente devia marcar presença no meio desta multidão em festa. Em Espanha já muito se fez mas ainda há muito por fazer. E se os espanhóis lideram esta luta em prol da igualdade de direitos nós por cá esperamos que talvez os ventos desta vez nos tragam bons casamentos.

Foi comovente ver parelhas de novios com os dizeres ‘Recien Casados’, não vi nenhuma parelha de novias mas vi montones de parelhas femininas, parece que elas corresponderam ao apelo uma vez que este ano a marcha era delas e para elas. Foi imperdível! Fiquei fã e seguramente voltarei muitas mais vezes!

Viva la España! Olé!

Memórias coloridas

quinta-feira, julho 3



O Verão tem destas coisas que nos faz soltar o pensamento tanto como a língua que por vezes percorre desenfreada e gulosa por memórias que nos torram e queimam os centros nevrálgicos que sabíamos que tínhamos e mais uns quantos que nunca imaginámos possuir. É verdade que tive uma juventude bem recheada de sensações e emoções, não me queixo de todas as seivas que por mim passaram e em mim escorreram, aliás hoje canto-as para que saibam da importância que tiveram em mim. A minha pueril sede de prazer transformou-se em fonte de letras e palavras que recriam outras vidas e outros tempos, alegres, despreocupados e despudorados também. Precisei de tudo isso para chegar onde estou hoje, à tranquilidade dos “entas” e da vida de casada com a mulher que amo.

Hoje acordei com os acordes daquela velhinha música do Juan Luis Guerra na cabeça, essa mesma de que todas se recordarão tão bem, do peixe que se deixa enfeitiçar pela sereia e se enfia na sua gruta feita aquário de cristal onde por momentos se deixa aprisionar para que ela possa tão somente desfrutar da alegria contagiante das borbulhas de amor que o peixinho tão delicadamente vai soprando na direcção do seu... talvez isso, não sei, mas esta música sempre me evocou imagens poderosas de estrondosos prazeres subaquáticos e para isso muito contribuiu o encontro que me sucedeu faz por esta altura uns dez anos... ou talvez mais que a memória tem destas particularidades ao manter a vivacidade das cores e a intensidade dos momentos independentemente da distância temporal que deles nos separa.

Foi com uma espanhola pois... já aqui confessei que fraquejo perante certas beldades latinas e esta tinha um fogo interior que não passava despercebido a ninguém, homem, mulher, ou até animal! Qué de pasión... ui! Essa noite não foi a primeira que nos vimos, ou por outra, talvez fosse a primeira vez que ela olhava para mim embora eu já seguisse o seu rastro há vários verões. Sabem aquelas mulheres que arrastam toda uma história atrás de si e que nos estonteiam pela intensidade com que num só olhar nos permitem vislumbrar a paixão que trazem dentro delas? Sabem aquelas mulheres que levam muitos à loucura e que conscientemente ainda nos fazem arrependermo-nos de todos os nossos amantes passados e futuros? É dessas que reza a história, dessas helenas de Tróia, que tão subtilmente nos subjugam e arrebatam e nos elevam aos píncaros ainda que apenas por brevíssimos momentos.

Nessa noite estava um calor daqueles espessos e pesados mas mesmo assim isso não me impediu de ir comemorar para o local do costume. Não me lembro ao certo ao que a comemoração se referia, mero pormenor que deixou de ter relevância após tudo o que me aconteceu. Fui com o grupo do costume e ela estava lá, nesse bar sito em terra indefinida onde como sempre deixámos sotaques e costumes amontoados à porta da saída. Assim despojada entrei e senti logo o olhar dela sobre mim, intenso e poderoso como uma mão firme pousada sobre o meu peito marcando um território prestes a ser ocupado. Há dias assim, em que uma invasão unilateral nos cega e nos tolhe a vontade de reacção, deixando-nos à beira do altar prestes a sacrificarmo-nos às deusas do amor e do prazer.

Durante horas bebi e dancei e em todos os momentos nunca deixei de a sentir ali, obsessiva e predadora, observando-me de todos os ângulos, empurrando-me para um canto de onde eu sabia que não iria nem quereria conseguir escapulir-me. Falou-me ao ouvido, segredou-me palavras que me transportaram para outros tempos e eu ali fiquei enfeitiçada pelo fogo latino que cirandava à minha volta.

“Mi casa” fui, foi, algo que nunca tinha feito antes e nunca voltei a fazer depois mas como resistir-lhe se a minha vontade já se tinha colado à dela tanto como a pele dos nossos corpos suados? Foi então que ouvi e senti essa música de Juan Luis Guerra numa coreografia que imaginei ter sido criada só para mim... “mojjjjaaadaaaa em ti” rosnava a leoa enquanto se despia e me despia até ficarmos só as duas nuas “bajo la luna”.

Normalmente não gosto e não me deixo levar no que toca ao sexo, prefiro ser eu a marcar o ritmo e a definir até onde esticam os meus limites. Mas nessa noite de loucura a minha voz calou-se perante a potência da sua e foi tudo como ela quis que fosse. Assumi-me passiva sem nunca o ter sido e deixei as suas mãos experientes brincarem com o meu corpo e o meu sexo. Movimentando-se duma forma fascinantemente perversa encostou-me a uma parede e atou-me as mãos a uma espécie de tela preparada para o efeito. Semi-reclinada, de mãos atadas como se fora algum Cristo abandonado a uma sorte desconhecida fechei os olhos e entrei numa outra dimensão, puramente sensual e sensorial.

Ela continuava a invocar algum demónio em forma de peixe à medida que lenta mas firmemente me abria as pernas para que pudesse explorar a gruta aquário que tinha elegido como seu abrigo nesta noite de lua cheia. Em pequenos toques suaves me penetrou de tal forma que senti toda a sua forma dentro de mim, boca, olhos, nariz, cauda, barbatanas, escamas que levemente se roçavam agigantando a gruta viva de onde brotavam mil pequenas fontes de água límpida e salgada que ela impacientemente sorvia. Espantoso era a forma como o meu corpo se lhe rendia aumentando a intensidade com que as águas cediam à medida que a cadência das suas borbulhas turbilhões aumentavam dentro de mim. Já não eram as suas mãos, nem a sua boca, nem a sua língua mas sim verdadeiras e majestosas ondas que se formavam à medida que a gruta atingia o seu auge e eu me sentia prestes a explodir sem me puder conter. E não me contive e foi como se uma enorme barragem se quebrasse pela força dos espasmos primordiais que me percorreram lançando jactos orquestrados com mestria por essa mulher libertadora que me quis mergulhar num mar imenso de infindáveis prazeres.

Talvez eu seja uma sortuda, bafejada pela sorte e pelo amor, mas neste início de verão escaldante é com imenso agrado que recordo todos estes pequenos detalhes que dão vida e cor à minha extensa manta de memórias coloridas.

Há sempre tantos caminhos

segunda-feira, junho 30

nota: o título e a fotografia podem não ter nada a ver com o texto. Ou então até têm.

Com isto dos caminhos para escolher não quero dizer que gosto de mulheres por escolha. O que escolhi foi viver os meus amores e paixões plenamente, quer fossem eles homens ou mulheres.

Agora, não me ponham um homem que dança bem e mexe bem as ancas a dançar comigo. Há umas semanas atrás fui ao jantar da Pós-Graduação (o 1º que fui durante todo o ano). A sangria desceu bem e eu já estava bem acelerada. Acabamos todos num bar dançante ao lado do restaurante.

Ah pois é, salsa foi a dança da noite e não é que descobri que um colega meu dança mesmo muito bem. O que posso dizer é *ai* *ai*. Se dissesse que aquelas ancas mexeram comigo estaria a exagerar mas se dissesse "no passa nada" estaria a mentir com quantos dentes tenho na boca.

Em chegando a casa, o álcool ainda a circular no sangue, agarrei no portátil e resolvi enviar um e-mail ao rapaz. *ai**ai*. Havia 4 R's na lista de e-mails da turma. Resultado, enviei o e-mail ao R errado. Quando descobri a falta de pontaria não voltei a tentar... já não havia álcool no meu sangue.

Agora o caminho a percorrer seria o contar ou não à M o que se tinha passado na noite anterior (até porque a meio do jantar e depois de uma qualquer frase minha um colega perguntou "Quem é a M?" e eu respondi muito calmamente e prontamente "É a minha namorada"... claro que dias depois toda a turma já sabia... é o que dá não pensar). Decidi contar e quando ela chegou à praia fiz-lhe o prólogo e o epílogo sem esquecer a entremeada entre os dois. Ela não ficou nem contente, nem triste, nem irritada. Acho que ficou apreensiva.

Poderia não ter contado nada mas achei que devia contar. Qualquer uma de nós sabe que mesmo estando apaixonadas e a amar o mundo exterior existe e as tentações também. O que importa é o que fazemos com essas tentações.

Nota: numa das aulas posterior ao jantar contei ao R o e-mail que enviei por engano ao outro R. Deu para rir e ficou mesmo por aí.

Ai e o sexo no campo... pois!

sexta-feira, junho 20



Agora voltando atrás e abaixo verifiquei que poderei ter defraudado as expectativas de algumas leitoras mais atentas que buscaram o texto à procura de tórridas cenas de sexo sem delas verem nem um boi. Vou então contar-vos como se passou a minha primeira vez, a minha perca de virgindade por assim dizer, já que considero que foi com um brutal orgasmo que me despedi dessa pudica casca que carregava em mim e desde então nunca mais fui a mesma!

Há que acrescentar que os meus pais sempre quiseram ter um filho varão e quando eu nasci e notaram a falta de algo em mim sofreram uma grande desilusão, sobretudo o meu pai que nunca ultrapassou esse facto e me tratou sempre como se fosse o filho com que ele tinha sonhado. Depois da morte da minha mãe o meu pai continuou tratando-me como se fora filho homem agora com ainda mais convicção. Felizmente nunca cá sofri de perturbações por ter tido uma infância desregrada e feliz, já que aos putos se dava mais liberdade do que às miúdas e assim que se me vieram as curvas e outras coisas que essas sim poderiam não ter vindo, gostei de me ver e saber mulher e não deixei de olhar para a Maria Cristina da mesma forma do que antes ou até com mais intensidade e vontade do que antes.

Ai a Maria Cristina... que recordações picantes me sobem à memória sempre que me lembro dessa bela rubia de pele morena que cheirava sempre a tardes solarengas passadas entre correrias e risos juvenis à beira do único regato digno desse nome lá nas terras fronteiriças que os seus abuelos possuíam. Mari Cris era meio espanhola e era de uma beleza rara que me fazia eriçar todos os poucos pelitos que possuía sempre que a via chegar para mais uma temporada de férias no campo. Acho que não havia moço da aldeia que não cobiçasse a pequena, e possivelmente algumas moças também porque a beleza quando é assim tão forte e evidente apela a todos os géneros e feitios.

Mari Cris gostava de mim, achava-me uma certa piada pelo meu ar meio assexuado. Estou em crer que foi ela que me seduziu, ela com os seus modos e maneiras e os seus jeitos femininos e sensuais... foi ela que preferiu uma iniciação diferente do que aquelas que as suas coleguinhas de escola lhe relatavam, feitas de suor, sangue e lágrimas e pouco ou nada agradáveis para as meninas que assim se queriam tornar mulheres. Os rapazes são brutos, quase selváticos no que toca ao sexo e não era pela dor que Mari Cris se queria transformar.

Lembro-me perfeitamente desse verão, como se fosse hoje. Lembro-me dessa tarde em que Mari Cris me levou para a casa vazia dos seus avós e me disse que quando dali saísse já não seria a mesma. Lembro-me de tomarmos banho numa banheira enorme cheia de água morna e perfumada. E de como ela me olhou nos olhos e sem nunca os fechar me beijou na boca. E eu fechei os meus e senti um frémito interior tão grande que pensei que seguramente enlouquecia. Temporariamente sim, deixei-me ir entregando-me nas mãos dela que me ensaboavam as costas e os braços e as pernas numa tentativa de me transformar em algo decente e apetitoso para a sua boca que eu sentia colada ao meu pescoço subindo e descendo lentamente em beijos longos e quentes.

Secámo-nos e deitámo-nos na sua cama, uma cama de dossel enorme que Mari Cris me dizia ter pertencido a uma duquesa que ali mesmo se envenenou para acabar com o sofrimento de um terrível desgosto de amor. Para mim era seguramente a cama mais maravilhosa e confortável onde já me tinha deitado e não perdi um só momento a pensar nessa outra alma torturada quando a minha estava a pontos de ser purificada. Ai a Mari Cris e as suas mãos quentes de fada que me volteavam massajando-me e tocando-me e puxando-me para si, encostando-me aos seus peitos redondos e perfeitos como dois pêssegos maduros com a pele prestes a estalar.

É duro confesso... mas ela merece que eu conte esse dia em que ela me transformou numa mulher. É falso quem diz que uma mulher não sabe o que fazer a outra mulher. As mulheres que não sabem, não querem, nem gostam de tocar noutras mulheres dificilmente saberão, quererão ou até gostarão de tocar em homens ou até nelas próprias. E quem não gosta de si mesmo nunca gostará de outro alguém a pontos de lhe querer proporcionar momentos de prazer inolvidáveis. É de sexo que aqui se trata, mas de sexo com estilo e com alma, nada desses rituais rotineiros que os casais tanto enaltecem para justificarem qualquer coisa que não tem justificação possível uma vez que o desejo ou existe ou não existe e o sexo ou é maravilhoso porque há sintonia ou então torna-se num banal acto mecânico vagamente frustrante.

Como eu desejava a Mari Cris... e ela sabia-o, sentia-o e nesse dia provou o quanto também ela me desejava a mim. Foi um anjo que me agarrou e me prendeu contra si. E foi um demónio que soltou os seus dedos dentro do meu sexo molhado e latejante. Acariciou-me ao mesmo tempo que me enchia a cabeça de palavras que eu nunca antes ouvira. Em círculos, em passagens suaves alternando com outras mais pujantes, abriu-me o sexo e penetrou-me com os dedos que prontamente lambeu, sorvendo cada gota do meu sabor como se fosse o líquido mais precioso e saboroso à face da terra.

Ai Mari Cris... fez-me vir como se fosse eu mesma a fazê-lo, tocando nas pontas soltas que ansiavam por ser estimuladas. Não sei durante quanto tempo me vim, na altura os espasmos prolongaram-se durante uma pequena eternidade... e quando voltei a mim senti uma vontade tão grande de lhe oferecer o mesmo sentir que a puxei contra mim e a sentei na beira da cama, abrindo-lhe as pernas sem pudor e sentindo o seu calor e o seu cheiro a chamarem por mim. Não há prazer maior do que ver o sexo da mulher amada chamando por nós assim. Especialmente e sobretudo porque é mais o que se esconde do que aquilo que se vê e é precisamente no que se esconde que residem os maiores segredos e as maiores descobertas. Nunca na minha vida tinha provado nada tão doce, tão sublime, tão forte e tão intenso. Dizem-me que há mulheres que possuem sexos salgados, talvez derivado àquilo que comem, mas o sexo de Mari Cris era muito doce, inebriante mesmo.

Senti-a ofegar, senti que algo nela estava a mudar enquanto o seu líquido escorria pela minha boca num caudal cada vez mais abundante. Mari Cris, Mari Cris, vem-te Mari Cris e baptiza-me para a vida, para o amor e para o sexo!

Ai e fazê-la vir... e como ela se veio... e eu de joelhos sem querer largar aquele sexo poderosamente magnético. Por muito que tenha gostado de ter tido o meu primeiro orgasmo nunca poderei comparar ao que foi proporcionar um orgasmo a uma outra mulher e para mim é por aí que o sexo no feminino me valida e me completa. É um gesto de altruísmo só alcançável por uma mulher. São raros os homens que não são egoístas por natureza, que não pensem sempre e em primeiríssimo lugar no seu próprio prazer, talvez porque em termos reprodutivos é mesmo assim que tem que ser.

Mas em termos humanos o sexo sempre foi, é e será como cada um@ de nós assim o desejar. Mari Cris abriu-me os olhos e o corpo para o sexo feito de paixão e cumplicidade e eu nunca mais quis nada que não fosse assim, leve, intenso, poderoso e libertador!

Também há Sexo no Campo!

quinta-feira, junho 19

O mais parecido com a Amareleja que consegui encontrar!

Olá a tod@s e perdoem-me um certo nervosismo a raiar o deslumbramento mas não posso evitar estar aqui a dar pulinhos de contentamento por este que é o primeiro rasgo que tenho numa vida que tem sido demasiado morna apesar das temperaturas quentes que se fazem sentir lá fora. Como é evidente o meu nome verdadeiro não é Miranda que a minha mãe coitadinha nem estudos tinha para passar do terrivelmente básico Maria, que nervos! Mas escolhi esse nick para prestar homenagem a essa grande actriz e personagem Miranda Hobbes de quem eu tenho alguns traços sim, apesar de aqui ninguém ter testa para ver que o meu status vai bem para além dum simples cabelo ruivo.

Deve ter sido engano, só pode, porque eu sou definitivamente cosmopolita e carrego comigo este sonho de um dia desembocar numa qualquer grande cidade da Europa! Os States não me atraem, nem sequer se eventualmente o tal de Obama ganhar as eleições em Novembro que eu sei destas coisas muito bem porque como dizem os GF, o Meo chega aqui sem problemas nenhuns e eu tenho net a uma velocidade que estontearia aqui a velharia toda da terra que esses coitados, nunca viram uma auto-estrada em movimento quanto mais uma que anda à velocidade supersónica deste meu rico satélite que me veio salvar de morrer estúpida aqui neste canto escondido e esquecido feito de burros iletrados e vacas analfabetas.

Mas o que me traz aqui hoje, para além de agradecer muitíssimo a oportunidade que a linda dona deste espaço me concedeu, são duas coisas que me inquietam a moleirinha e uma delas é que de facto existem lésbicas no campo sim, porque não é apanágio das gentes da cidade gostarem de ver e de se encostar em mulheres bonitas. Eu gosto, gosto muito até, sempre gostei desde a mais tenra idade. O problema para nosotras é que aqui mulher bonita é coisa que não abunda e como tal lavo mais as vistas com a minha rica televisão digital do que em exemplares de carne e osso. Sempre que posso dou ali um saltinho à vizinha España que nestas matérias de direitos para tod@s está anos-luz à nossa frente, e viva la España! Se à beira de chegar à fronteira a estúpida e vesga da burra não tivesse soçobrado com o peso da minha mãzinha grávida quem sabe não seria eu uma orgulhosa españuelita cheia de salero e sevilhanas aos bordões que eu sou uma fã inconfessável da maravilhosa Papi da série letra L que também cá me chega via satélite e quando não chega sei bem dar uso aos 8 Mbps para me satisfazer a curiosidade em downloads pouco arriscados que ao menos valha-nos isso que polícias e ASAE aqui nem vê-los que fogem todos com o calor e o medo dos incêndios!

E a outra coisa é que em todos os anos que já vivi e sempre soube de mim continuo sem perceber porque raio hão-de os outros continuar a dizer que uma pessoa é lésbica por opção porque eu por opção sou ruiva, agora o resto é mesmo coisa que já nasceu comigo e de que desconfiei logo ali aos 5, 6 anitos quando me senti brutalmente inquietada por uma prof de ginástica bela e escultural que nos foi enviada de Beja e que me obrigava a dar cambalhotas atrás de cambalhotas e eu dava só para a ver sorrir para mim. Foi assim que eu soube, muito antes de saber que existia uma palavra para colar à minha condição com a qual convivo mais ou menos bem, enfim, eu comigo convivo bem, os outros, alguns, é que nem por isso mas também é para isso que com uma enorme alegria irei tentar encontrar aqui um canto, ainda que virtual e minusculito, para partilhar as agruras de ser uma quarentona ruiva e lésbica perdida numa aldeia esquecida onde posso atestar que há sexo q.b. e demasiado campo por aí espalhado, mas também não se pode querer tudo e eu dum modo geral até me encontro satisfeita e esperançada!

Vejo-vos a tod@s no arraial que é já no dia 28 de Junho! Onde houver festa e o comboio chegar eu lá estarei a marcar presença e a reivindicar tudo aquilo a que tod@s temos direito!

 

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